Entrevistas


Diretor, produtor e roteirista, Emanuel Mendes nasceu em Minas Gerais e vive em São Paulo desde 1999. Depois de se formar em Comunicação Social, em Ribeirão Preto, estuda cinema no Hollywood Film Institute, em Los Angeles, retornando ao Brasil após dois meses de uma experiência que considera definidora. Trabalhou como assistente de produção em comerciais de TV, curtas, médias e longas-metragens, além de passagens pela Casablanca Finish. Estreou como realizador em 2002 com o curta Assis & Aletéia, uma história de amor surrealista inspirada pelo cinema de Luis Buñuel e Salvador Dalí. Em 2008, lança seu segundo trabalho na direção, Amarar, um conto fantástico sobre uma jovem apaixonada incapaz de distinguir passado, realidade e imaginação. Lançou pela Sincronia Filmes, produtora que fundou com o amigo Francisco Costabile em 2011, seu terceiro trabalho na direção, É Quase Verdade, sobre o qual fala a seguir.
Você afirmou que É Quase Verdade representou um sem-número de primeiras vezes para você – foi seu primeiro filme em preto e branco, o primeiro rodado em digital, a primeira comédia, o primeiro feito quase todo na improvisação, entre outros. Dentre todos esses desafios, o que foi especificamente mais difícil?
Fazer as coisas na improvisação, sem dúvida nenhuma. Eu nunca tinha trabalhado assim – sempre fiz meus trabalhos baseado numa preparação quase neurótica, em ter um controle absoluto, pensando em todos os detalhes, desenhando todos os planos, essas coisas. Mas como eu tinha proposto para mim mesmo fazer um documentário – mesmo que fosse um documentário falso, e que, dessa forma, necessitava de uma preparação –, resolvi que iria fazer no improviso, preparando apenas o mínimo possível, me permitindo ter a maior liberdade para realizar tudo, de uma maneira muito leve, sem stress. Não fizemos storyboards, não planejei as coisas com tanta antecedência e preciosismo de detalhe – pensei comigo: Será que vou conseguir? Foi assustador, mas ao mesmo tempo super libertador e uma puta experiência bacana.
Onde esse desafio se revelou mais libertador, em qual processo do trabalho?
Na filmagem, principalmente. Nós fizemos um ensaio com os atores, apenas para delimitar os papéis, quem seria quem, quem diria o quê, quais as marcações de cena, achar o tom das interpretações, que era muito importante. Foi um processo muito do tipo ir fazendo enquanto ele acontece. Olhar para o que o ator te oferece e dizer: Ei, isso faz sentido! Olha, isso é muito bom! Uau, isso é sensacional! Aí então você tempera um pouco mais as coisas, joga um pouco de molho aqui, um outro tanto ali, vai sentindo os sabores do seu filme. Para alguns planos eu imaginava um posicionamento de câmera muito específico que no ensaio acabamos por realmente incorporar, mas em outros casos descartar. E quando fomos para o set mesmo, dei liberdade para todos os atores improvisarem, para que o Mario (Cassettari, diretor de fotografia) improvisasse, discutisse comigo, discordasse de mim – essas coisas foram superimportantes.
Dirigindo o ator Pedro Ivo
  
Para você, que afirmou gostar de realizar os filmes com um controle absoluto, houve algum momento da criação de É Quase Verdade onde sentiu que algo estava fora do controle?
Lá nos subúrbios da memória não consigo me lembrar de algum instante onde isso tenha ocorrido. Talvez quando estávamos escrevendo o roteiro – quando tivemos uma de nossas fatídicas primeiras versões, que sempre achamos que são boas, mas que nesse caso aqui não era de jeito nenhum. Uma possível combinação de elementos foi suficiente pra perceber isso: um personagem principal que não tinha nada a ver, uma história que não comunicava absolutamente nada, nenhum senso de humor. O que escrevemos dessas primeiras versões foi o necessário para dizer, Ei, isso não está funcionando. E aí você recomeça praticamente do zero, e aí talvez perceba que, sim, algo não estava sob controle, que no nosso caso era a história propriamente dita. Depois desse processo, as coisas começam a andar do jeito que elas andam nos filmes; do modo como eram para ser. Encontramos as locações, estabelecemos como iríamos filmar alguns planos, que precisavam ser muito específicos. Achar os atores certos para os papeis certamente trouxe um outro sabor para a mistura. Mas no geral, o filme se fez sozinho, como as vezes acontece.
E por que a decisão de se fazer uma comédia, um documentário falso?
Quando você termina alguma coisa, e isso acontece comigo muitas vezes, você quer ir para o caminho contrário – seja porque está entediado de seguir sempre numa mesma linha ou simplesmente porque quer fazer outra coisa mesmo. No caso aqui foram pequenas partes que foram se juntando para se formar o todo – e elas vinham vindo há tempos, só que às vezes você não percebia ou não queria perceber, porque elas eram incômodas, tanto para nós quanto para os outros que as iriam receber. Mas as partículas estavam no ar te dizendo que era para ir por esse caminho, era para se realizar uma comédia, era para se fazer um documentário falso sobre uma situação que, a rigor, vinha me incomodando há um tempinho.
Checando o material
Vocês escreveram o roteiro com alguém em mente?
Escrevemos o roteiro com o Pedro (Ivo, que interpreta o protagonista) na cabeça, mas os outros apareceram ou porque eram contatos do Pedro ou porque já havíamos trabalhado com alguns deles, que nos levaram aos outros. Era preciso que eles evocassem o que seria o arquétipo dos personagens e não o clichê, justamente porque uma das coisas que estávamos ironizando era o clichê. E por mais que tivéssemos um roteiro, no qual você inevitavelmente acaba colocando um pouco de você, por mais que algumas coisas estivessem pré-estabelecidas, por mais que tivéssemos feito um ensaio, fico feliz de ver que o resultado foi algo que eles criaram – eles compreenderam totalmente o espírito da coisa e os personagens.    
O filme possui momentos de humor sarcástico, iconoclástico, muitas vezes demolindo e ironizando esses clichês e paradigmas do cinema brasileiro que você mencionou. Mas ao mesmo tempo ele é sério, os personagens dizem coisas que são tragicômicas, ou mesmo bastante dramáticas a respeito do Brasil, de política, de descaso e abandono. Foi uma decisão consciente ter essa mistura de ânimos durante o filme?
Rá, é claro. Quer dizer, eu acho. Provavelmente não tão consciente assim – até porque, como eu disse, quase tudo foi feito no improviso e muitas coisas descobrimos no ensaio, no dia a dia da filmagem, que resolvemos incorporar. Estávamos sempre buscando o riso solto, a diversão, tentar não ser tão sério e sisudo assim. Acho que a ironia é um modo de você contornar um pouco as coisas nesse sentido, de não ser tão clássico ou impositivo demais. Muitas falas foram escritas, muitas delas baseadas no que o André (Campos Mesquita, corroteirista do filme) e eu pensamos a respeito de determinadas coisas. Mas em outros casos nós apenas jogávamos uma semente para um ator e ele vinha com uma árvore extremamente frondosa – todos os atores foram sensacionais no quesito improvisação. O Paulo Lustig, por exemplo, foi um que joguei a semente do que queríamos que o personagem dele dissesse e fizesse e ele nos entregou a mais espetacular plantação que tivemos a sorte de captar em imagens. De novo, devo muito aos atores por tudo isso.
É Quase Verdade também toca, ainda que de maneira leve, no que se vem discutindo no Brasil já há alguns anos – o fato de a cultura do país estar condicionada a editais, patrocínios e concursos, que muitas vezes ficam nas mãos de uma burocracia incapaz de resolver alguns de seus principais entraves. Você acha que o filme pode ajudar a levantar essa discussão?  
Hummm... Nessas horas acho que sou obrigado a concordar com o que o Guilherme (de Almeida Prado, um dos atores do filme) diz – isso não é uma responsabilidade do cinema, é uma responsabilidade do país, dos encarregados de se fazer as leis, de uma vontade política maior. Se os políticos não ligam para o que é mais básico e importante, como educação e saúde, o que dirá da cultura?
Falando em Guilherme de Almeida Prado, você poderia dizer como o conheceu e qual o significado dos filmes dele para você?
Não é sempre que conseguimos conhecer nossos ídolos e, melhor ainda, ficar amigo deles. As duas coisas aconteceram comigo e só tenho a agradecer pelos filmes dele – que foram alguns filmes da minha formação –, e pela possibilidade de troca de ideias, de experiências, essa cumplicidade que é uma das melhores coisas que a boa amizade sempre traz.
Além do Zelig, de Woody Allen, no qual vocês discutiram antes de escrever o roteiro, houve mais alguma outra influência do cinema, alguma coisa da literatura, da televisão, que eventualmente entrou no processo?
Ah, sim. Houve várias. Algumas conscientes, outras incoscientes, outras que apareceram na filmagem, seja por sorte ou por ocasião do momento mesmo. Me lembro que na época em que escrevíamos o roteiro procurei assistir a muitas comédias – eu nunca tinha trabalhado nesse gênero antes (mesmo que tivesse uma vontade enorme de trabalhar), e só realmente botando a mão na massa você percebe o quanto é difícil. Uma coisa é você ouvir os outros dizerem o quanto comédia é difícil, outra coisa é você sentir isso na pele! (risos) Felizmente nós tivemos um time que, além do improviso, tem muita experiência com humor, com o timing muito bom e controlado para a coisa. E, é claro, você busca referências em coisas de que gosta – por exemplo, eu busquei coisas do Billy Wilder, um tantinho dos Trapalhões, um pouco mais do Tonacci (Andrea Tonacci, diretor do cinema marginal brasileiro), como o Bang Bang, que acho que é um filme que de certa forma tem a ver com o nosso, um outro tanto do cinema italiano, e bastante do Robert Downey Sr., pai do Robert Downey Jr., especialmente um filme dele chamado Putney Swope. Acho que a sequência do tango tem muito a ver com Jacques Tati, que era alguém que estava na minha cabeça na época. E também quadrinhos do Asterix, Laerte, uma mistura boa assim. Engraçado também como as coisas no geral tomam um rumo que você muitas vezes nem imagina: achei incrível o figurino da Simone (Leite, que interpreta a personagem Talidomida), porque a princípio a personagem dela seria uma releitura da personagem do Apocalipse 1,11 (peça de Fernando Bonassi encenada pelo Teatro da Vertigem), mas do jeito que ela fez e do modo como ficou vestida, e como filmamos a cena dela na cadeira de rodas com o Lucio (Marques, que interpreta Cabeça de Fósforo), pensei comigo: Putz, ficou muito mais próximo da Gelsomina! (personagem de Federico Fellini no filme A Estrada). Eis aqui um exemplo de uma influência inconsciente, que surgiu lá na hora. São coisas assim que te dão prazer e parecem te dizer: siga em frente que é por aí mesmo, rapaz.
Com o fotógrafo Mario Cassettari
Esse tipo de abordagem mais livre, onde se permite que o acaso interfira nas ações, parece ter orientado como vocês rodaram o filme. Você acha que isso acontece apenas com o documentário ou com o filme de ficção também, já que este último é sempre mais preparado?
Parece que, quando se faz um filme, ou pelo menos a experiência que tenho tido até agora, a providência divina toma de assalto o controle da situação e parece te dizer: Ah, então tá. Então vocês já vão rodar o filme? Ok, vamos enviar alguns sinais e ideias para vocês incorporarem no trabalho. Usem se quiserem, descartem se não estiverem interessados, mas eles estarão lá. Ao meu ver, isso não é um privilégio do documentário, isso acontece em todos os momentos das nossas vidas, não é mesmo?
O filme é um média-metragem, e está com cerca de 27 minutos. Vocês também chegaram a fazer uma versão de 50 minutos. O quanto o filme mudou na sala de edição e como foi a decisão de cortá-lo para o formato final?
Nada muito maciçamente grande ou diferente foi modificado na edição. Tínhamos muito material com o Pedro, especialmente dentro do táxi, durante a viagem ao aeroporto, que estava muito bom. Nessa versão de 50 minutos, utilizamos quase tudo que filmamos. É claro, montagem é, a grosso modo, tirar o que não serve e deixar apenas o que te ajuda a contar a história. E, por mais que todo o material estivesse bom, com falas, situações e improvisações muito engraçadas, nós fomos cortando para diferentes versões, elimando coisas apenas para ver qual o efeito isso iria causar. Se a conversa ali naquela cena levava a coisas do tipo zzzzz...., bem, aí você tem que cortar.
Depois de experimentar com tudo o que disse aqui – seja no gênero do filme, na improvisação dele, nas influências, entre outros –, como você se vê de agora em diante? O que gostaria de fazer e/ou explorar, ou que tipos de histórias gostaria de contar?
Ah, se me é permitido dizer uma coisa assim, eu adoraria poder filmar em película outra vez. Essa coisa da textura da imagem, o modo mecânico como tudo funciona – diferente do eletrônico –, é muito ultrasensacional. E não só o modo como é filmado, mas como é projetado também. Sei que os tempos são outros, e que isso pode soar como preciosismo ou uma fantasia muito molhada ou romântica, mas é uma bela fantasia para se ter na cabeça.




A director, producer and screenwriter, Emanuel Mendes was born in countryside Brazil and has been living in São Paulo since 1999. After graduating from Social Communications in Ribeirão Preto, he studied Film at the Hollywood Film Institute, in Los Angeles, and returned to Brazil after a two month experience which he calls a defining one. He has worked as a production assistant in short films, feature films and has also been to Casablanca Finish, as assistant editor. He made his first short film in 2002, Assis & Aletéia, a surreal love story inspired by the cinema of Luis Buñuel and Salvador Dalí. In 2008 he released his second short, Amarar, a fantastic story about a young woman incapable of distinguishing her past, her reality and her fantasies. Through Sincronia Filmes, the production company which he founded with friend Francisco Costabile, he has made It´s Almost True, his third film about which he talks now.
You said that It´s Almost True has represented a lot of first times for you – it was your first film in black and white, the first one shot on digital, the first comedy, the first made almost entirely on improv. Among all those challenges, which one was specifically more difficult?
Making things on improv, for sure. I´d never worked like that – have done my works based on an almost neurotic preparation, having absolute control over everything, thinking about all details, drawing the shots, stuff like that. But I proposed to myself to make a documentary – even if it was a fake one, and which, this way, needed a certain level of preparation –, I´d decided to improv, preping things at minimum, giving myself all the necessary freedom, very smooth, no stress. We didn´t storyboard anything, didn´t plan things far in advance and with too much eye to details – thought to myself: Will I know how to do it? It was scaring, but at the same time very freeing and a hell of an experience.
In what process of the work has this challenge been more freeing?
During shooting, mainly. We rehearsed with the actors, just to define the characters, who would be who, who would say what, what were the scene marks, finding the tone of the portraying, which was pretty important. It was very much a process of making it up as you go along. Look at what the actor has to offer you and say, Hey, that makes sense! Look, this is damn good! Wow, this is awesome! Only then you dress up your salad, put some more spices here, a little bit more there, you start smelling your film. For some shots I´d imagine a very specific camera position during the rehearsal that we ended up using but other times we would discharge completely. And when we went to the set I gave total freedom for all the actors to improvise, to Mario (Cassettari, the DP) improvise, discuss with me, disagree with me – those things were pretty important.
Directing the actor Pedro Ivo
For a person who said you like to have absolute control, was there any moment during the creation of It´s Almost True that you thought things were getting out of control?
My sewer dump of a memory cannot recall. Maybe when we were penning the script – when we had our first drafts that we think are damn good, but in this specific case here it was not. Possible combination of elements at work: a main character that was practically nothing, a story that wouldn´t say anything, no sense of humor. What we had written was enough to say, Hey this is not working. And then you start from scratch again, and maybe then you figure out that, yes, something was out of control, which in this specific case was the story itself. After this process, things come together the way they do in movies; the way they were meant to be. We found the locations, we established how we would shoot some shots, that needed to be very specific. Finding the right actors certainly has brought another flavour to the recipe. But in general, the film made by itself, as it´s usually the case.
And why the decision of making a comedy, a fake documentary?
When you finish something, and this has happened to me a lot, you wanna follow the other way around – either because you´re bored of going always in the same direction or simply because you wanna do something else really. In this particular case all these little things were coming together in order to form the whole body – and they´d been coming for a long time, but you wouldn´t notice, or wouldn´t want to notice, because they were troublesome, for us as much as for anybody else who would receive them. But the particles were in the air telling you this was the way, it was meant to be a comedy, it was meant to make a false documentary about a situation which, in a way, had been bothering me for a long, long time.
Checking the rushes
Did you write the screenplay with somebody specific in mind?
We wrote the script with Pedro (Ivo, who plays the main role) in mind, but the other ones appeared either because thay were a contact of Pedro´s or because we´d already worked with them, who took us to the other ones. It was necessary that they evoked what the archetypical was, not the clichè, because we were being ironic with the clichè. And even though we had a script, in which you inevitably put a little bit of yourself, even though some things had been pre-established, even though we had rehearsed, I was glad to see that the result was something they created – they figured out the whole thing completely and their characters, too.
The film has its moments of sarcasm, iconoclasm, demolishing and making ironies with these clichès and paradigms of Brazilian Cinema that you´ve mentioned. But at the same time it is serious, the characters say some things that are either tragicomical or even very dramatic about Brazil, politics, negligence and abandon. Was it a conscious decision to have this mix to the whole?
Ha! Sure. I guess. Probably not so conscious – because, like I said, almost everything was done on improv, and many other things we found out on rehearsal or during shooting, that we decided to incorporate then. We were always looking for the big laugh, the fun of it, trying not to be so serious or upnosed. I think irony is a good way to bypass things in this sense, not to be so classic or too much imposing. Many lines were penned, many of them based on what André (Campos Mesquita, cowriter) and myself think about certain things. But in other cases we would just throw the seed to an actor and he would come up with an extremely fruitful tree – all the actors were extremely good on improv. Paulo Lustig, for instance, was the one who I threw a seed upon to see what his character could do and say and he came out with the biggest plantation our camera had the luck to capture in images. Again I´m indebted to all the actors.
It´s Almost True also tackles, even though on a slightly smooth way, on what society in Brazil has been discussing for a long time now – the fact that the culture in the country is dependent upon contests, sponsorships and government support which a lot of times are in the hands of a bureaucracy incapable of solving many of its problems. Do you think that the film can help bring out this discussion?  
Hmmm... This time I must agree with what Guilherme (de Almeida Prado, who plays one of the characters in the film) says – this is not a responsibility of the cinema, this is a responsibility of the country, of the ones in charge of making laws, of a stronger political will. If politicians do not care about what is most important and necessary, like education and health care, what can you say about culture?
Speaking about Guilherme de Almeida Prado, could you tell how you met him and what his films mean to you?
It´s very rare when we have the chance to meet our heros, and much better, befriends them. Both of these things have happened to me and I am very thankful for his films – which were some of the films of my formation – and for the possibility of exchanging ideas, experiences, this complicity that good friendship can always evoke.
Besides Zelig, from Woody Allen, about which you discussed during the scriptwriting, have there been any other film influences, something from television, a little from literature, that eventually made into the process?
Oh, yeah. Lots of them. Some were conscious, some unconscious, others came up during shooting, either because of luck or the occasion really. I recall that at the time of scriptwriting I tried to watch as many comedies as I could – I´d never worked on such genre (even if I itched towards it), and only when you´re really working with it you get to know how difficult it is. One thing is hearing about how hard comedy is, another thing completely different is when you´re working with it! (laughs) Fortunately we had a team who, besides improvising really well, had a very good timing for the thing. And of course you seek out references that you enjoy – for example, I searched for many things done by Billy Wilder, a little bit from Os Trapalhões (Brazilian comedy troupe), a little from Tonacci (Andrea Tonacci, underground Brazilian film director), like Bang Bang, which I think is a film that has something to do with ours, some more from Italian cinema, and a lot from Robert Downey Sr., father of Junior´s, especially a film of his called Putney Swope. I think the tango sequence is indebted to Jacques Tati, who was a person in my mind at that time. Also comic strips from Asterix, Laerte (Brazilian cartoonist), a mix like that. Its´funny though how sometimes things get on a different direction: I just loved Simone Leite´s costume (she plays the character of Talidomida), because at first her character would be a new version of the one in the play Apocalipse 1,11 (a Brazilian theater play staged by Teatro da Vertigem group), but the way she played and the way she got dressed up, and also the way we shot her sequence with Lucio (Marques, who plays Cabeça de Fósforo) on a wheelchair, made me think: Holy shit, she looks just like Gelsomina! (the Federico Fellini character in the film La Strada). Here is an example of an unconscious influence, that happended to happen in there. Those are the things that give you pleasure and seem to say to you: keep going, boy, because that´s the way.
With DP Mario Cassettari
This sort of free approach, where chance seems to interfere in the actions, seems to have oriented how you guys shot the film. Do you think it also happens in fiction films, even though they´re all preplanned, or only with documentaries?
It seems that, when you make a film, or at least my experience of making them so far, the divine providence takes the drive and seems to tell you: Oh, alright. So you´ve decided to shoot the film. Ok, we´ll send you some signs and ideas so you can incorporate them in the work. You can use them, discharge them if you feel like it, but they´ll be there. To me, this is not only a privilege of documentaries, but something that happens in our lives, everyday, isn´t it?
The film is 27 minutes long. You have also edited a 50 minute version of it. How much has the film been altered in the editing room and how was the decision to cut it to this final version?
Nothing massively shifted in the editing room, no large structural shift or anything like that. We had tons of material with Pedro, especially inside the cab, driving to the airport, which was pretty damn good. In this 50 minute version, we used almost everything we had shot. Of course, editing is, roughly speaking, taking out what is not good and leaving all that helps you out in pushing the story forward. And even though the material was good, with lines, situations and very funny improv, we began editing things out to different versions, exterminating things just to check the effect of it. If the dialogue in that particular scene would take us to something like zzzzzz…., well, this leads to a cut.
After experimenting with all you said here – be it in the genre, on improv, the influences – how do you see yourself from now on? What would you like to do and/or explore, or what kind of stories would you like to tell?
Oh, if I may say so, I´d love to shoot with film again. This thing about the texture of the image, the mechanical way everything works – in opposition to electronic – is superawesome. Not just using the camera negative – but the way it is projected as well. I know times are different and this may sound like prescious or a very romantic wet fantasy, but it´s a lovely fantasy to keep in my head.




Mauricio de Caro Esposito, ou simplesmente Mauricio Esposito, gosta mesmo é de barulho. E isso ele vem provando a cada nova incursão pelos meandros da banda sonora de curtas, médias e longas-metragens, e também passagens pela bateria com sua banda formada majoritariamente com amigos. Além de professor universitário na Anhembi Morumbi - onde desenvolveu um mestrado analisando o som de produções clássicas como as de Kurosawa, Hitchcock, Fellini e Coppola -, Esposito coordena o trabalho de diversos filmes rodados dentro e fora da Faculdade. Fez a captação de som e todo o trabalho de pós de É Quase Verdade, e aqui conta tudo o que rolou na produção.     
Como vocês definiram o conceito de som de um filme como É Quase Verdade, que é e não é um documentário ao mesmo tempo?
Bom, desde o início do projeto ficaram claras duas coisas: que ele teria um som, digamos, normal, do que seria um documentário mesmo – e quando digo isso falo pelas sequências com o Guilherme de Almeida Prado, que era uma entrevista (e que você não podia fugir do esquema), e do Paulo Lustig, toda captada na rua, e que teve entrevistas também. Mas ele também tinha essa pegada subversiva, e que a gente procurou levar para o som da mesma forma. Por isso, foi mais interessante dublar muitas das cenas – como as do Pedro Ivo –, o que deu esse aspecto de filme de ficção mesmo. E finalmente, colocar um pouco de tempero na mistura – coisas como você fazer o som ajudar a contar a história (tipo, o que você está vendo não é o que está ouvindo, barulhinhos estranhos, desordem e tumulto de rua que as vezes tampam o que os personagens estão dizendo, e que também não deixa de conversar com o documentário de verdade), enfim, uma pegada nesse naipe.  
É Quase Verdade conta uma história, com começo, meio e fim. O som, neste caso, também ajudou no desenvolvimento da narrativa?
No estúdio, trabalhando no som
Claro – e essa é a função do som, apoiar a imagem, principalmente no cinema clássico, coisas como o que Hollywood fazia nos anos 30, 40 e 50. Através da temporalidade sonora, através do espaço, você também está contando uma história. Você pode, por exemplo, descrever um ambiente com o som, como eu disse, e aí é que entra essa coisa de o som ajudar no desenvolvimento da narrativa, do storytelling. Ali, no filme, tivemos vários momentos onde isso ocorreu – onde você só vê um personagem, às vezes em close, mas você sabe exatamente onde ele está porque o som descreve o lugar. Em outros momentos, procurei brincar um pouco com essa ideia de o filme ser um documentário falso, por isso que nas cenas do Guilherme, apesar de ser uma entrevista “séria”, feita nos moldes do documentário tradicional, eu inseri um som de um corvo bem lá no fundo. E assim por diante.
Vários diretores nesse sentido já utilizaram o som como ferramenta até mais barata de produção – justamente pelo fato de ele ajudar no storytelling, como você disse, ou incrementar a carga dramática de uma cena.
Sim. A imagem, por exemplo, pode mostrar uma determinada coisa, e aí vem o som e adiciona informações que não estão sendo vistas. Ao mesmo tempo, você trabalha o som e os efeitos sonoros através da psique do personagem, para enriquecê-lo ou enriquecer a cena.
Isso aconteceu com o som que vocês colocaram de um eletrocardiograma, que a toda hora corta a narrativa, não é mesmo?
É. Isso foi ideia do Manel (Emanuel Mendes, diretor do filme), o que também não deixou de ser uma pegada meio maluca que o filme tem. Esse eletro era talvez para mostrar que o cinema brasileiro, e talvez até o cinema como um todo, já está mesmo na UTI, precisando desesperadamente de um tratamento, de novos ares, o que não deixa de conversar com o que o filme discute.
Esposito, com o diretor Emanuel Mendes e o ator Pedro Ivo
O filme, ao mesmo tempo que segue alguns convencionalismos do documentário – como ser filmado em preto e branco, ter muita improvisação, uma sensação de chegar no local e sair filmando, sem muita preparação –, também tem uma pegada anti-convencional, como se tivesse sido um documentário “pensado”, preparado com antecedência. Isso também aconteceu com o som? O quanto dele foi, digamos, de improviso, e o quanto foi pensado?  
A principal regra que a gente seguiu foi não seguir regras. Em uma palavra: desobediência. Era preciso desobedecer todos os convencionalismos já existentes, por isso o som do eletrocardiograma, por exemplo. Ele entra de uma forma muito pontual, e, de novo, ajuda a narrativa a ir em frente, mas o próprio fato de você ter um som de um eletro ali, e que estoura num determinado momento, já é um troço meio doido, né? E, é claro, assim você tem um som que foi “pensado”. Mesmo nas sequências de rua, com todo o barulho que ela deve ter, você tenta fugir um pouco do convencional. Houve um ruído, que estava no som-guia da câmera, que acabamos utilizando e modelando também, que foi o de uma freada, um freio, provavelmente o de um ônibus, que deu um efeito muito interessante, mas aconteceu lá na filmagem, na hora. E incrivelmente casou direitinho com o diálogo do Pedro. Outro exemplo de um som pensado foi o do cachorro.
Sim, era isso que eu estava pensando também. Como se deu o processo de criação do som do cachorro?
Acho que desde o início era para ser essa voz metálica. Precisava ficar engraçado, mas até num certo ponto. Eu mesmo gravei a voz e enviei para o Manel, houve um momento em que pensamos no Pedro (Ivo, que interpreta o protagonista) para dublá-lo, porque afinal o cachorro era do personagem, eles estavam juntos na parada. Mas quem acabou fazendo foi o próprio Manel – nós gravamos no meu estúdio, em São Bernardo. Sabíamos que não podíamos exagerar. Fizemos vários experimentos: com a voz mais grossa, menos grossa, fina, e a mais fina, no pitch mais agudo que conseguimos chegar, ficou engraçado, mas avisei o Manel que parecia muito Alvin e Os Esquilos e aí talvez não ficasse tão engraçado assim, pelo contrário, seria meio exagerado. O resultado que está no filme foi um meio-termo que encontramos. 
Vocês utilizaram referências externas para compor o som? Por exemplo, outros filmes, outros documentários?
Além desse som-guia que estava na câmera, durante a pós produção o Manel veio com as ideias dele, é claro, e eu acrescentei as minhas. Ele trouxe como referência apenas um DVD, ironicamente um documentário musical, se não me engano sobre o Radiohead. Não tanto pela banda em si, que eu nem gosto, mas porque o trabalho de som era fodido mesmo, muito bom. Muito do que você ouve no É Quase Verdade teve como base o som desse documentário – e isso inclui o eletrocardiograma, o som do cachorro, a ambientação urbana, um barulho estranho aqui e outro ali.
Captação do som na rua, com a assistente Babi Costa
Você desenvolveu a tese de mestrado em cima do trabalho de som de muitos filmes clássicos e importantes – fitas de diretores como Kurosawa, Hitchcock, Coppola. Ao mesmo tempo, você tem como ídolo o Walter Murch, editor e sonoplasta. O quanto o estudo de obras e pessoas como essas afeta o seu trabalho – no sentido sempre de melhorá-lo, de aprendizado colocado em prática?
Eu venho do áudio e não do cinema. Fui ensinado a tentar sempre a melhor captação, a melhor mixagem, sou um neurótico da qualidade. Por isso foi natural a identificação com o cinemão americano, os caras fazem isso há muito tempo, já têm um padrão muito bem estabelecido de trabalho. Sigo o padrão americano, ou, pelo menos, tento executá-lo. Pra mim, dois deuses do som são: Walter Murch e Ben Burtt.
O que você acha dessa dicotomia que muitas vezes ocorre no cinema – o diálogo versus o som? Muitos diretores, principalmente os da era clássica do cinema, se incomodavam pelo fato de os roteiros serem excessivamente dialogados, porque, afirmavam eles, o cinema seria apenas som e imagem.
Pois é, eu tenho uma opinião bem formada a respeito desse assunto. Eu acho que o diálogo, e você não tem como fugir disso, é o carro-chefe dos filmes como um todo. Mas o fato é que ultimamente há um certo exagero nesse sentido. O personagem, o ator, as atuações, ficam muito em cima do diálogo, condicionados demais a ele. Se você pegar o cinema antigo, lá atrás, principalmente o expressionismo alemão, toda a carga dramática estava na feição do ator, na mise en scène, havia até um certo exagero, uma teatralização do cinema, ele se aproximava muito do teatro. Com o advento do cinema falado, os talkies, toda a atuação, toda a carga dramática foi descarregada em cima da voz, do veículo voz. Eu acho que existem outras maneiras de se contar uma história – não estou querendo com isso minimizar o diálogo, lógico que ele é muito importante, ele tem que existir –, mas eu acho que a imagem e o som podem ser tratados de uma outra maneira para dar o recado. Esse exagero do diálogo é quase como um regurgitar, é muito excessivo. Dá para você dosar muito bem as coisas para que não haja esse excesso.


 




Mauricio de Caro Esposito, or simply Mauricio Esposito, really likes making noise. And he has been proving that on each new dive through the details of soundtrack recordings for short and feature length films, and also playing the drums with his band formed mainly with friends. Besides being a professor at Anhembi Morumbi University - where he developed a Master´s on classic productions by Kurosawa, Hitchcock, Fellini and Coppola -, Esposito coordinates the various film projects made in and out of campus faculty. He has done the whole direct sound recording and post sound mixing of It´s Almost True and here he tells everything that went on during the production of the film.  
How did you define the sound concept of a film like It´s Almost True, which is and isn´t a documentary at the same time?
Well, since the beginnig of the project two things became very clear: that the film would have, like, a “normal” sound, which would come from documentaries as a whole – and when I say that I´m talking about the scenes with Guilherme de Almeida Prado that was a real interview (and from which you can´t escape from), and with Paulo Lustig, also shot in the streets and which had interviews as well. But the film also had this subversive thing, and we tried to give it a shot in terms of sound. That´s why it became much more interesting to dub certain scenes – like the ones with Pedro Ivo –, which gave the film this flair of being a fiction movie. And finally we tried to add up some spice to the recipe – things like making the sound help out telling the story, like what-you-hear-is-not-what-you-see type of thing, weird sounds, noise and confusion from the streets that many times cover up what the actors are saying, and which in a way has a connection to real documentaries. Anyway, something like that.
It´s Almost True tells a story with a beginnig, a middle and an end. Has the sound in this case also helped in pushing the narrative forward?
In the studio, working on the sound
Of course. And that´s basically the function of sound, giving support to the image, especially in the classic era of film, things done in Hollywood in the 30s, 40s, and 50s. Through sound temporality, through space, you are also telling a story. You can describe an ambience, a place, like I said, using sound, and then comes this thing about the sound helping out in telling the story, in pushing the narrative forward. In the movie we had a lot of sequences where such thing happened – where you see a character in close up, but you know exactly where he is because the sound describes the place. In other moments, I tried to play a little with this idea of it being a fake documentary, that´s why in the scenes with Guilherme de Almeida Prado, even though it is a “serious” interview, done in the way of a traditional documentary, I inserted the sound of a crow right in the background. And so forth and so on.
Many directors in this sense have utilised sound as a way to minimize costs – simply because, like you said, it helps out in telling the story or increasing the dramatic strengh of a scene.
Yes. The image, for example, can show you something, and then the sound adds up information that you do not see. At the same time you can work sound through the character´s psique, in order to make him/her richer or makes the scene richer.
This, I believe, has happened to the sound of the electrocardiogram, that cuts the narrative almost all times, right?
Yeah. This was Manel´s idea (Emanuel Mendes, the director), which in a way has a connection to this crazy thing the movie has. This electro sound is perhaps there to show that Brazilian Cinema is already dying out, is in hospital, in desperate need of fresh air and new ideas, new treatment, which also has a connection to the ideas developed in the film.
Esposito, with director Emanuel Mendes and actor Pedro Ivo
The film at the same time it follows some conventions from the traditional documentary – like filming in the streets, a sense of improvisation, being shot in black and white – also has this anticonventionalism thing, almost as if it were a documentary thought and prepared very much in advance. Has this also happened to the sound? How much of the sound was, let´s say, thought over, and how much of it was improvisation? 
The main rule that we followed was not follow any rules. In one single word: disobey. It was necessary to disobey all preconceived conventions, that´s why the sound of the electrocardiogram, for instance. And it comes in the film in very precise moments, and again helps out in telling the story, but the fact that you have an electro sound, and which explodes in a certain moment, is in itself something crazy, isn´t it?  And then you have an example of a sound that was “thought over”. Even during the street scenes I tried to escape from conventions. There was this noise, which came from the guiding sound in the camera, that we ended up using, which was this breaking sound. Apparently it came from a bus, and it gave a very interesting effect, but it was something that happened there during shooting. And it merged perfectly with what Pedro Ivo says. And another example of a sound that was thought over was the dog´s.
Yeah, I was just thinking about it. What was the process of creating the sound of the dog like?
I think since the inception of the project they wanted this metallic voice. It had to be funny, but until a certain point. I recorded the sound myself, and then sent it over to Manel, there was a moment when we thought about Pedro (Ivo, who plays the main character) doing it, because the dog was the character´s, they were together there. But Manel himself ended up doing the whole thing – we recorded everything in my studio, in São Bernardo. We knew we couldn´t overdo it. We made several experiments: with the voice a little lower, less harsh, smooth, and then the highest pitch we could afford to. It was funny but I told Manel we couldn´t exaggerate otherwise it wouldn´t be funny, it would sound like Alvin and The Chipmunks and then maybe it could be ridiculous. The result we hear in the movie is a midterm of what we found.
Did you use external references to produce the sound? Like, for example, other films, other documentaries?
Besides this guiding sound in the camera, during post production Manel came over with his ideas and I added up my own, of course. He only brought over as a reference a DVD, ironically of a musical documentary, if I´m not mistaken it was about Radiohead. Not so much for the band themselves, that I personally don´t like, but the sound work in that thing was truly awesome, really, really good. Much of what you hear in It´s Almost True had as a basis that particular documentary – and this includes the electrocardiogram, the dog sound, the urban ambience, a weird sound here and there.
Direct sound recording, with assistant Babi Costa
You have developed a thesis in your Master´s Degree over the work of such directors like Kurosawa, Hitchcock, Coppola. At the same time, you have the sound designer and editor Walter Murch as a hero. How much studying the work of people like them has affected your own work, what it brings to you in practical terms?
I come from the audio area, not the cinema. I was taught to try making the best sound capture, the best mixing, I am a quality control freak. It was pretty natural my identification with American cinema, the guys have been making this for a long, long time, they already have a quality standard in their work. I follow their standard, or at least I try to execute it the best way I can. To me Walter Murch and also Ben Burtt are the two gods in audio and sound design.
What do you think about this dicotomy which happens in the cinema – dialogue versus sound? Many directors, especially the ones from the classic period, would be bothered by the fact that their scripts were sometimes excessively talked, too much dialogue, because they used to say that the good cinema was just the conjunction between image and sound.
Yeah, I have a very firm opinion about that. I think dialogue, and you cannot escape from that, is the flagship of films as a whole. But the thing is, nowadays there´s some amount of exaggeration concerning acting, which is most of the times under the dialogue effect. If you look at the old days of cinema, right behind there, especially during the German Expressionism, all the dramatic effect was on the face of the actor, on the mise en scène, it was a bit like theater. When talkies came all the acting was discharged on the voice, the voice as vehicle for acting. I think there are other forms of telling a story – and I am not trying to minimize dialogue, of course it is important, it has to exist –, but I think that image and sound can be treated in other ways in order to tell the idea. This exaggeration of dialogue is almost like regurgitating. It´s very excessive. You can balance things in order not to have such an excess.







Compositor de cinema, com currículo premiado em diversos festivais nacionais e internacionais, Marcel Soares é também produtor musical, instrumentista e DJ de música eletrônica, área na qual teve grande destaque - já participou de diversos concursos em várias partes do Brasil, sempre com um repertório eclético e moderno. Estudou piano com a renomada professora Rita Zarur e Teoria Musical com o maestro Rogério Santos, da Orquestra Sinfônica de São José dos Campos, além de composições propriamente ditas com o também compositor Leandro Gardini, sob o método EIS. Em seu estúdio Audillus - nome, inclusive, bastante apropriado -, cria também efeitos acústicos e foley para projetos de animação - entre os quais os da Escola Meliès, em São Paulo. Aqui, Marcel conta sobre como foi o processo de criação da trilha de É Quase Verdade, suas influências e opiniões sobre música de cinema e instrumental como um todo. 
Como você se envolveu na produção de É Quase Verdade?
Foi o Emanuel (Mendes, diretor do filme) quem me contactou, porque ele conheceu meu trabalho da trilha que fiz para O Pescador de Sonhos (animação digital vencedora de inúmeros prêmios, dentre os quais o de trilha musical). Nós começamos a nos corresponder durante muito tempo – muito antes até de eu me envolver no filme, falando basicamente de trilhas sonoras, de compositores favoritos.
Você tem escolaridade como trilheiro e é também produtor de música eletrônica. Já chegou a compor para documentários ou trabalhos do gênero – tipo reportagem ou algo assim?
Não, nunca. O É Quase Verdade é o mais próximo que cheguei disso. (risos)
E como foi o processo de criação?
O Emanuel me enviou o roteiro, que achei muito engraçado, mas na época, se não me engano, o filme teria apenas uma música – que era para a sequência da viagem ao aeroporto. O que ele fez foi me passar uma música como referência e eu trabalhei em cima do tema. Era uma música estilo circense, bastante acelerada e divertida, do Georges Moustaki, compositor egípcio que fez trilhas para a Nouvelle Vague francesa. Fizemos várias versões até chegarmos no resultado que está no filme.
Mas parece que houve mais referências, não é mesmo?
Ah, várias delas! É que, como naquela época o roteiro continha só uma música, porque era uma das primeiras versões, evidentemente eu só compus para aquela sequência. Mas depois fomos trocando figurinhas, ele foi me passando as novas versões do roteiro, e aí imaginando onde poderiam ser inseridas novas músicas – como as do crédito inicial, do final, o tango para os mendigos. Nesse meio tempo, fomos nos falando sobre quais compositores se encaixavam como referência, e, além do Moustaki, inúmeros nomes apareceram, como Nino Rota, Henry Mancini, Georges Delerue, Morriconne, e até o Jonny Greenwood, do Radiohead, que fez uma trilha muito moderna para o Sangue Negro, filme do Paul Thomas Anderson. Mas sabíamos que teríamos que nos concentrar num tipo de som – porque afinal o filme é uma comédia –, e foi aí que entrou o Roberto Carlos nessa história. (risos)
O Robertão? Como aconteceu isso?
É que o crédito inicial precisava ter essa música que soasse como o Roberto Carlos, só que sem a voz. Era para ser uma instrumentação que lembrasse o que o Roberto canta, mas no momento em que ele iria entrar, corta-se abruptamente para o som da rua e das pessoas. O Roberto foi o gatilho para que encontrássemos o som do filme (risos), e daí partir para outras referências, a principal delas o Henry Mancini e a trilha que ele fez para um filme chamado Um Caminho Para Dois.
O compositor em seu estúdio.
Foi muito difícil trabalhar com todas essas referências? Às vezes elas podem ajudar, em outras podem ser uma camisa de força.
É, foi mais ou menos isso o que aconteceu. (risos). Quando um diretor define algumas trilhas de referência o que acontece é que ele acaba se acostumando tanto que muitas vezes fica difícil ver as cenas sem elas, o que torna o processo de aprovação complicado, já que nada vai soar exatamente igual à referência. Um caso curioso foi o que aconteceu com o filme 2001 – Uma Odisséia no Espaço, onde as trilhas de referência das cenas iniciais, escolhidas pelo diretor Stanley Kubrick, acabaram fazendo parte da música final e, ironicamente, o compositor não foi avisado, e ainda ficou sabendo disso no dia da pré-estreia. Voltando ao É Quase Verdade, o Emanuel me mandava todas essas referências e eu devolvia para ele, mas ele me devolvia com um milhão de anotações, querendo modificar isso ou aquilo, querendo que soasse assim ou assado. Não sei quantas versões diferentes acabei criando de um mesmo tema, mas foram várias delas. Isso ajudou e atrapalhou ao mesmo tempo, mas faz parte do processo. Quando eu topei entrar no projeto, eu imaginava que teria mais liberdade de expressão, não esperava que seria dessa maneira, mas, enfim, isso acontece... Em todos os projetos anteriores as minhas ideias não tiveram tanta dificuldade de aprovação, e confesso que fiquei bem confuso com a situação. Enfim, é o eterno casamento entre diretor e compositor (risos). Mas a gente acabou se entendendo porque ele percebeu que, daquele jeito, não chegaríamos a lugar nenhum. Foi a primeira vez que ele trabalhou com um compositor original porque nos outros filmes que realizou ele sempre escolhia temas ou músicas já previamente gravadas, como música clássica, por exemplo.
O filme também terminaria com o Saudosa Maloca, de Adoniran Barbosa. Há um momento no filme, inclusive, onde ela é mencionada. Mas parece que não foi possível utilizá-la. O que aconteceu realmente?
Pois é, o pessoal não conseguiu os direitos ou mesmo a permissão para utilizar o Saudosa. É uma pena porque se encaixaria perfeitamente com o filme e as idéias que ele desenvolve. Mas isso também foi bom por um lado porque pude compor um tema para os créditos finais, no lugar do Adoniran! (risos) Acabamos trabalhando em cima da composição Mulher de Vida Fácil, de autoria do pessoal do Show Brega, de Minas Gerais, do qual aliás o Lucio Marques, um dos atores do filme, faz parte. Inclusive ele canta em umas das cenas do filme. Foi a possibilidade de se colocar, aliás, um grande samba final encerrando o filme, o que não deixa de ser também uma homenagem ao Adoniran e ao samba paulista como um todo.
Você já deve ter ouvido aquela máxima de que a melhor trilha sonora é aquela que não se ouve – ou seja, quanto mais sutil e ajudando a contar a história melhor. O que acha disso?
Acredito que depende muito de cada projeto e principalmente das pessoas envolvidas. Às vezes a concepção de um diretor para o design sonoro de um filme pode ir nessa direção, em outras vezes pode ir no sentido totalmente oposto. O importante é que a experiência final do público seja sempre a melhor possível. E isso depende do casamento perfeito entre imagem e música. E acredito que isso está inclusive acima da concepção pessoal de um compositor ou mesmo de um diretor. Esse é o grande desafio! Quanto mais a música ajudar a contar e a levar a história adiante, melhor. Ela precisa sim ser, em muitos casos, imperceptível, mas de uma forma sutil e inteligente, e isso é possível através de texturas sonoras e até mesmo com o uso intencional de harmonias e melodias. A música tem um impacto muito poderoso no ser humano, talvez seja a única forma de arte que te atinge imediatamente – basta você escutá-la e ela já afeta seu emocional, diferente de qualquer outro meio de expressão. Acho que a música, principalmente a boa música, e essencialmente a boa trilha sonora, pode ser responsável em muito pelo impacto de um filme, até por seu sucesso (ou fracasso, dependendo do caso).
Quais exemplos você citaria?
Ah, inúmeros! (risos) Você consegue imaginar o filme Tubarão sem o tema principal do compositor John Wiliams – em ostinato simples e repetitivo? E o próprio 2001 sem as memoráveis composições eruditas de Johan Strauss e Richard Strauss nas cenas iniciais? Quer dizer, até dá pra imaginar, mas são filmes totalmente diferentes, não é mesmo?
Marcel Soares com suas partituras.
E quais compositores hoje você admira?
Gosto de vários deles. Para mim, um dos mais talentosos hoje em dia é o francês Alexandre Desplat, que fez trilhas para O Curioso Caso de Benjamin Button, Argo, A Rainha¸e muitos outros. É um compositor de muita sensibilidade. Mas eu não poderia deixar de citar grandes nomes como John Williams e Hanz Zimmer. Uma grande influência em minha carreira, sem dúvida, é o compositor erudito Phillip Glass – que fez a trilha do Nosso Lar – e que, na minha opinião, influenciou totalmente a música da nova geração, tanto a de cinema quanto a música pop, com seus temas simples e harmonias e ritmos minimalistas. Patrick Doyle, o Danny Elfman, que faz as trilhas para o Tim Burton, o Marco Beltrami, Fernando Velazquez, Mychael Danna, que fez As Aventuras de Pi, a lista segue sem fim (risos). No Brasil, nós temos muita gente talentosa também: o Marco Antônio Guimarães (do grupo Uakti), que compôs para o Lavoura Arcaica e o filme do Fernando Meirelles, Ensaio Sobre a Cegueira; gosto muito do que o Antonio Pinto faz, também o Alexandre Guerra, o Dado Villa-Lobos, que fez uma trilha soturna e cheia de intervenções eletrônicas para O Invasor.  
O cinema brasileiro parece ter descoberto só agora a música instrumental, e ela tem, ironicamente, muito pouco espaço no país também como um todo, é uma tradição muito pequena. É também chamada de música incidental, aquela que acompanha o ritmo e os respiros de um filme. Por que você acha que isso acontece e por que há tão pouca valorização dela e de seus compositores?
Acho que é uma questão de tradição, mas existem  fatores econômicos envolvidos. O cinema brasileiro nunca teve a cultura de valorizar a composição autoral para cinema e ainda hoje não é muito diferente, e isso é muito triste. A música incidental e o design de som muitas vezes são deixados para o segundo plano. Acho que isso está ligado ao processo de produção e investimento. O cinema nacional não precisa dar lucro, já que 99% dos projetos possuem subsídios do governo. Então os produtores (e inclusive os diretores) acabam economizando recursos na parte sonora, erroneamente considerada menos importante. É o famoso coloca qualquer musiquinha que vai dar certo! (risos) Então a obra final sempre deixa a desejar. Aproveitando a oportunidade vou fazer um desabafo: é um fato comum em produções do cinema nacional incluir uma composição famosa ou inédita de algum ícone da música brasileira, aquilo que gera credibilidade instantânea a nível de exposição na mídia. Essa é uma jogada de marketing e na maioria das vezes esse tipo de escolha não se enquadra no contexto de um filme. Claro que cada caso é um caso e muitas vezes isso é o que vai funcionar dentro da concepção sonora. O cinema tem uma linguagem própria e única e isso exige composições e texturas sonoras específicas para atender a esse tipo de mídia. Não é porque um compositor é talentoso em compor canções e hits que ele possui a técnica, a linguagem e principalmente a sensibilidade para criar música de cinema. Acredito que a música seja a alma de um projeto cinematográfico, e isso não deve ser mais deixado para o segundo plano em nosso país.



A film composer, with many national and international awards, Marcel Soares is also a musical producer, an instrumentalist and a DJ in electronic music, an area which he had a lot of recognition - he has participated in many contests in various parts of Brazil, always with an eclectic and modern repertoire. He studied piano with famous professor Rita Zarur and Musical Theory with maestro Rogério Santos, from Orquestra Sinfônica de São José dos Campos, and also, under the EIS method, composition itself with Leandro Gardini. In his studio Audillus - a name, BTW, totally appropriate - he creates accoustic effects and foley for animation projects, among them the ones at Escola Meliès in São Paulo. Here, Marcel tells about the creation process for the musical score for It´s Almost True, his influences and opinions about film music and instrumental music as a whole.

How did you get involved in the production of It´s Almost True?
It was Emanuel (Mendes, director of the film) who first contacted me because he got to know my work through the score I did for The Dream Fisher (a digital animated film winner of many awards, among them best original score). We began writing to each other for a long time – even before I was involved in his film, basically talking about soundtracks, favorite composers.
You have experience as a composer and you´re also a DJ in electronic music. Have you ever composed for documentaries or works of the genre – like news reportage, for instance?
No, never. It´s Almost True is the closest I got to making such a thing. (laughs)
And what was the creation process like?
Emanuel sent me the script, which I thought was very fun, but at the time, if I´m not mistaken, the film was supposed to have only one piece of musical score – which was for the sequence of the trip to the airport. He sent me a piece as a reference and I worked over that theme. It was a circus kind of music, very fast and very fun, composed by Georges Moustaki, an Egypcian musician who did some scores for the French New Wave. I did many versions until we got to the one heard in the film.
It seems there were more references, right?
Oh, many of them! The thing is, since the script at that time was in its first version, I composed only for that sequence. But then we began exchanging ideas, he would send me the newest versions, and we would imagine where exactly we could put the new pieces – like the main credits, the end credits, the tango for the beggars. In the meantime, we would talk about composers who could be references, and many names popped up like Nino Rota, Henry Mancini, Georges Delerue, Morriconne, and even Jonny Greenwood, from Radiohead, who did a very modern score for There Will Be Blood, the film by Paul Thomas Anderson. But we knew we had to concentrate on a certain kind of sound – after all it was a comedy – , and then Roberto Carlos came up on the way. (laughs)
Roberto Carlos? How did that happen?
The main credits had to have this musical piece that sounded just like Roberto Carlos, but without his voice. It had to be an arrangement which resembled a song by Roberto, but at the right moment he would begin to sing, it would abruptly cut to the sound in the streets and people chatting. Roberto triggered the sound of the film in a way (laughs), and from then on other references as well, the main one was Henry Mancini and a score he did for a film called Two on the Road.
The composer in his studio.
Was it very hard to work with all these references? Sometimes they can help, but other times they can trim your imagination.
Yeah, it was more or less like this. (laughs) When a director has some scores as references what happens is that he/she gets so much used to those references that most of the times it gets harder to see the scenes without them, which makes the approval process very complicated because your score will never sound like the references. A curious case happened with the soundtrack for Stanley Kubrick´s 2001 - A Space Odyssey, where the referential score of the initial scenes ended up in the final version and ironically the composer didn´t get to know that, he would only know about it on the day of the premiere. But anyway back to It´s Almost TrueEmanuel would send me theses references and I would return to him, but he would give them back with one million notes, wanting to change here and there, wanting to sound like this or like that. I don´t know how many versions I did of a single theme, it must have been thousands of them. It helped and bothered me at the same time. When I said yes to the project I thought I would have more freedom, couldn´t expect it would be like this, but anyway, those things happen… Not even in previous projects had I so many problems in having my ideas accepted, and I must confess I got a little upset with the situation. Anyway it´s the eternal marriage between composer and film director (laughs). But in the end we got along pretty well because he realised we wouldn´t get anywhere had we worked under those circumstances. It was his first time working with a composer because in his other films he would always pick up music from third parties, like classical music, for example.
The film would also end with Saudosa Maloca, the song  from Adoniran Barbosa. There´s a moment in the film where they mention the song. But it seems it wasn´t possible to use it. What happened really?
Yeah, they couldn´t get the rights to the song. It´s a pity because it would fit right in with the mood and ideas the film evokes. But at the same time it was good because I could compose a theme for the final credits in Adoniran´s place! (laughs) We ended up working on the theme for Mulher de Vida Fácil, a piece by the guys of Show Brega, from Minas Gerais, a musical group in which Lucio Marques, one of the actors in It´s Almost True, is a member. He sings the song in the film, BTW. Actually it was also a very nice chance to end the film with a really big final samba, which in itself is also an homage to Adoniran and the samba made in São Paulo.
You have probably heard that one which says that the best soundtrack, or musical score, is the one you don´t hear – meaning the more subtle it is the better. What do you think about this?
I believe it depends a lot on each project and mainly on the people in it. Sometimes the director´s conception for the sound design of a film can move towards this direction, in others it can go completely the opposite. The most important thing is that the final experience of the audience should be the best possible. And that depends on the perfect marriage between music and images. And I also beleieve this is far above the composer´s personal conception or even the director´s. That´s the greatest challenge. The more the music helps out in telling the story and move it forward the better. Yes, it needs to be imperceptible, but in a subtle and intelligent way, and this is possible through sound textures and even by using melody and harmony. Music has a very powerful impact, maybe it is the only art form that hits you right away – just from hearing it, it can grab you by the guts, which is different from any other medium. I think music, and especially good music, and essentially the good film score, can be responsible for a lot of the emotional impact of a movie, even for its success (or failure, depending on the case).
Which examples could you give?
Oh, many! (laughs) Can you imagine Jaws without John Williams´s score, in ostinato and with a simple repetitive motif? And 2001 itself, without the memorable classical compositions by Johan Strauss and Richard Strauss in the beginnig? I mean, you can, right? But it would be a totally different film experience, wouldn´t it?
Marcel Soares with his scores.
And who are the composers nowadays that you admire the most?
I like a lot of them. To me one of the most gifted is the French Alexandre Desplat, who did scores for films such as The Curious Case of Benjamin Button, Argo, The Queen, and others. He has a lot of sensibility. But I couldn´t left out great names like John Williams and Hanz Zimmer. A big influence in my career, without a doubt, is composer Philip Glass - who scored Nosso Lar - and who, in my opinion, has totally influenced the music of my generation, not only film music, but pop music as well, with his simple and minimalistic rhythm and harmonies. But there´s also Patrick Doyle, Danny Elfman, who scores for Tim Burton, Marco Beltrami, Fernando Velazquez, Mychael Danna, who did Life of Pi, the list goes on and on. (laughs) We have many talented people in Brazil, too: Uakti, the guys who composed for To The Left of the Father and Fernando Meirelles´s Blindness, I like a lot what Antonio Pinto does, there´s also Alexandre Guerra, Dado Villa-Lobos, who did a very somber score and full of electronic interventions for The Tresspasser.  
Brazilian Cinema seems to have discovered instrumental music only now, and it has, ironically, very little space in the country as a whole. It is still a very small tradition. It is also called incidental music, the one that follows the actions in the screen and the breathing of the film. Why do you think that happens and why there´s so little space for it and its composers?

I think this is something related to tradition, but also economic factors. Brazilian Cinema has never had the tradition of giving value to film scores and until today this is not so much different, and I think it is very sad. Incidental music and sound design are most often left aside. I believe this is a matter of investment and the production process as a whole. Brazilian Cinema does not need to profit, since 99% of the projects are financed by the Government. So producers (and sometimes directors) try to save money by not investing so much in music and sound, which are wrongly considered minor parts. It´s that famous idea of putting a little music that in the end it will be alright! (laughs) So the final result most of the times lacks quality. Taking the chance, here´s a little taking off one´s chest: it is very commom in Brazilian Cinema to put a famous song or a famous pop icon of Brazilian Music to compose the soundtrack, in order to get media exposition. This is certainly a marketing game play which most of the times does not fit the context of a film. Of course each case is different and most of the times it is what it´s gonna work in the sound conception. Cinema has its own language and that demands especific texture to reach this sort of media. It´s not because such and such composer is talented in making hits that he/she has the technical skills required for the job, or even the sensibility to compose film soundtracks. I truly believe music is the soul of a project, and this can not be left out as a secondary element in our country anymore.





Diretor de fotografia e que, durante vários anos, foi professor da Universidade Anhembi Morumbi, Mario Cassettari compôs a luz nua e crua para É Quase Verdade, onde não utilizou um refletor sequer, essencialmente manipulando a câmera 5D. Para além da foto, Mario também trabalha como colorista de filmes e shows em geral – em 2012, finalizou o DVD Caixa de Ódio, de Arrigo Barnabé. Fez a montagem do clipe Tietê, de Chico Saraiva, e coordenou a captação de El Grande Concerto, show realizado no Teatro Oficina e produzido pela Casa de Francisca com mais de 40 artistas de expressão da música contemporânea paulistana. Como diretor, Cassettari fez, em parceria com Suzana Reck Miranda, o documentário Carta Sonora, realizado para o programa DOCTV4 e, para o mesmo programa, montou o documentário Paraíso – Paisagem da Memória. Nesta entrevista, ele fala sobre o processo de É Quase Verdade e as dificuldades e desafios do filme.
Como você se envolveu com o É Quase Verdade?
Através de terceiros. Alguns meses antes de filmarmos, estávamos discutindo um outro projeto que seria feito pela produtora dos rapazes, e nessa aí conheci o Emanuel (Mendes, diretor do filme). Não falamos do É Quase Verdade, me lembro que conversamos sobre câmeras, ele me mostrou uma camereta que havia acabado de adquirir e foi só. Bem depois, quando eu estava em Chapecó, ministrando uma oficina de vídeo, nos falamos outra vez, e ele me enviou o roteiro. Marcamos de nos encontrar várias vezes, mas as agendas nunca batiam. Até que um dia a coisa foi, e conversamos tomando um café, depois que eu já tinha lido o roteiro.
Cassettari filma "É Quase Verdade"
O filme tem essa pegada de cinema de rua, feito no peito e na raça, quase como guerrilla filmmaking. Você tem experiência como fotógrafo nesse estilo e até já realizou um documentário como diretor. Esse expertise te ajudou no processo?
Tudo ajuda, todas as suas experiências – mesmo que cada projeto que você se envolva seja diferente. Tudo o que posso dizer é que gosto de me envolver com coisas legais, coisas bacanas. Fazer o filme foi mais um desafio.
Esse desafio incluiu filmá-lo sem luz nenhuma. Como isso aconteceu?
Bom, aconteceu assim porque não tínhamos grana para a luz mesmo (risos). Tivemos um apoio da Anhembi Morumbi, mas foi mais durante a pós-produção, já que eles nos cederam estúdio de dublagem e tudo o mais. Isso, de não ter luz, ao mesmo tempo que foi um desafio, representou uma estética que acabamos por explorar. Quando fizemos as pesquisas de locação, fotografando debaixo do Masp, nas ruas e avenidas, em viadutos, e tudo o mais, já obtivemos o resultado que queríamos. Por exemplo, já sabíamos que iríamos filmar em preto e branco, porque a pegada era essa, a pegada era realizar um documentário falso como se realiza um verdadeiro – principalmente no Brasil, onde o gênero é muito forte.  
No que fazer um filme sem luz artificial dificulta ou facilita alguma coisa?
Dificulta nos momentos em que você precisa dela, como em lugares escuros, como aconteceu debaixo do viaduto do parque Dom Pedro, onde filmamos o Aparício e os amigos. Estava foda pra mim ali, e, por mais que eu estivesse usando lentes claras (nós usamos lentes claras para o filme inteiro), que captam muita luz e são muito sensíveis, o fato de não ter um refletorzinho, ou mesmo não poder usar um rebatedor, já fez parte do pacote do desafio. No primeiro dia de filmagem, estava um sol do caralho, e ele estava na posição ideal, bem na cara do Pedro (Ivo, que interpreta o personagem-central). Pude fazer todo tipo de experimento com a luz ali, colocar a câmera nos mais diferentes ângulos, muito embora a gente já tivesse pré-determinado como seriam os ângulos.
"Humm, acho que ficou bom, hein?"
Vocês utilizaram storyboards?
Quando eles existem eu uso, mas quase nunca há. Esse pré-determinado que disse foi quando estabelecemos, já na pesquisa de locação, como iríamos filmar alguns planos, não todos, apenas alguns muito específicos. E a única coisa que tive foram umas fotografias que o Emanuel me enviou como referência para alguns planos. Eram fotografias de entrevistas, com a câmera ligeiramente mais baixa do que o normal – uma pegada meio maluca, fora do comum, que tentamos usar para alguns personagens, como o do cachorro. Só que não deu para usar essa daí porque o cachorro não colaborou. Tínhamos um plano lindo, com a câmera baixa, no chão, engrandecendo o cachorro (o contrário do que fizemos com o Aparício, que foi de cima, encurralando-o), mas só durou uns poucos segundos, porque o danado se levantou e saiu fora. O restante da filmagem foi todo improvisado na hora.  
Nesses momentos você é obrigado a ser criativo, a se virar?
Claro que sim. São as iluminações dentro e fora de cena! (risos)
No filme, você também trabalhou com o Jefferson Coppola, um fotógrafo de still especializado em reportagens. Esse foi o primeiro trabalho em cinema que ele faz, apesar do sobrenome famoso! Como se deu a colaboração entre vocês?
Chamei o Jeff inicialmente para fazer os stills do É Quase..., o que ele fez, e fez super bem. Mas durante a filmagem, ele se envolveu mais no processo da luz (de novo!), me ajudando com as lentes, porque ele trouxe uma lente sensacional pro dia que filmamos o Pedro no Masp e logo depois a mãe do personagem (interpretada por Sonia Maria Silva) bem ali perto. Os ângulos que ele escolheu também para fazer os stills de divulgação foram diferentes dos meus, porque em geral o stiller fica do lado da câmera para pegar mais ou menos o que se está filmando, mas ele livremente não fez isso – o que só acrescentou para as fotos de divulgação. Além disso, uma das coisas que ele sabe explorar muito bem são os espaços, as linhas, ele tirou fotos lindas da filmagem nesse aspecto. Também conversamos muito entre os takes, trocando ideias e sugestões, e ele acabou conquistando a codireção de fotografia.
Olho artificial
Além de ser fotógrafo e diretor de fotografia, você também atua como colorista de filmes, shows e vídeos musicais. Para você, o que é mais difícil ou desafiador – captar imagens ou trabalhar em cima delas em uma pós-produção?
São coisas semelhantes. Evidentemente, numa filmagem, você tem toda uma parafernália que você não tem quando faz uma pós-produção, há toda uma correria, um tumulto, você tenta acertar a luz aqui ou ali, trabalha com um rebatedor acolá, você molda a luz de uma maneira, digamos, mais nua e crua, até porque podem haver incorreções ou imperfeições, que vão ser corrigidos depois numa finalização. Mas está tudo muito mais acessível agora depois do velório e enterro da película – principalmente com esses softwares de tratamento de imagem, como o DaVinci, que te permitem trabalhar até em casa, no seu próprio computador.
Mas parece até que, no É Quase Verdade, vocês deram um tratamento na imagem para aproximá-la mais da película.
Ah, sim, isso aconteceu. Porque o Emanuel queria tirar um pouco esse aspecto vídeo da coisa toda. Algumas cenas, principalmente as que envolviam movimento de câmera, às vezes muito bruscos, não tinham aquela flicada normalmente presente no filme – era muito evidente que era vídeo. Nós filmamos tudo com a Canon 5D, que, na época, em 2011, estava meio que na moda, e realmente é uma câmera muito boa, com um sensor que traz uma textura de imagem próxima ao que seria o 16mm, só que melhorado. O que pegou foi que o Emanuel me mostrou uma restauração linda do Casablanca, com muito grão, uma coisa meio arenosa – e também mais dark e rica. Resolvemos que partiríamos dali a nossa “restauração”, que faríamos como os caras da Warner Bros., sem tentar deixar ruído.
Para finalizar: o que é mais desafiador, trabalhar com a cor ou com o preto e branco?
Os dois são prazerosos e cada um traz seus desafios. Dá pra se fazer um milhão de experimentos com a luz – dá pra saturá-la, torná-la mais quente, mais evidente na imagem, e aí se conseguir um efeito interessante. Dá pra retirar um bocado dela, tipo uns 60%, que foi o que fizeram no O Resgate do Soldado Ryan e aí também criar uma outra atmosfera. As possibilidades são infinitas. O preto e branco é... bem, preto e branco, não é? Muitas das imperfeições que as vezes acontecem com a cor você consegue de uma certa forma esconder com o preto e branco, mas o efeito por si só já é bonito de se ver. É claro, você pode mexer no contraste, na luminosidade, o que vai dar uma outra cara para o seu trabalho. Tudo tem a ver com a estética, com as suas intenções, e o que você quer comunicar.







A cinematographer who was a teacher at Anhembi Morumbi University, in São Paulo, Mario Cassettari shot It´s Almost True without using any artificial light, essentially manipulating the Canon 5D camera. Beyond cinematography, Mario has also been working as a colorist for films and musical specials in general – in 2012, he finished up the Caixa de Ódio DVD set, by Arrigo Barnabé. He has also edited the videoclip Tietê, by Chico Saraiva, and has coordenated the shooting of El Grande Concerto, a show for Teatro Oficina produced by Casa de Francisca with more than 40 artists from the contemporary São Paulo musical scene. As a director, Cassettari has made, in partnership with Suzana Reck Miranda, the documentary Carta Sonora, made for the DOCTV4, and, for the same show, has edited the documentary Paraíso – Paisagem da Memória. In this interview he talks about the process of making It´s Almost True, its challenges and difficulties.
How did you get involved with It´s Almost True?
Through third parties. Some months before shooting it, we were discussing another project that would be made by the guys´s film company, and in this meeting I got to know Emanuel (Mendes, director of the film). We didn´t really talk about It´s Almost True, I remember that we spoke about cameras, he showed me one little HD camera he had bought and that was all. Only later, when I was in Chapecó, workshopping about video production, we spoke again, and he sent me the script. We tried to set up a meeting many times but the time schedule was hard. Until one day we made it, and we had a coffee and talked about the film after I´d read the script.
Cassettari shoots "It´s Almost True"
The film has this look of guerrilla filmmaking, something done like bravura kind of a thing. You have experience as a cinematographer in this style and you have even made a documentary as a director. Has this expertise helped you in the process?
Everything helps, all your experiences – even when each project you get involved in is different. All I can say is that I enjoy being involved with nice things, interesting ideas. Making this film was one more challenge.
This challenge has included shooting it without light. How did that happen?
Well, it so happened that way because we didn´t have money for the light (laughs). We had support from Anhembi Morumbi, but they helped more during post production, since they conceded the audio studio so we could dub the film. This thing of not having had light was a challenge but at the same time it represented an aesthetic that we ended up using. When we scouted locations, taking pictures under the Masp Museum, in the streets and avenues, under bridges and so forth, we obtained the results we wanted. For instance, we already knew we wanted to shoot the film in black and white, because that was the trend, to make a fake documentary the very same way you make a real one – especially in Brazil, where the genre is very strong.
Does it make it more difficult or less difficult shooting with no artificial light?
It makes things difficult when you need lighting, like in dark places, as it so happened under the bridge at Dom Pedro Park, where we shot Aparício and his friends. I was all fucked up with lighting in there, and even using fast lenses (we only used them during the making of the film), which capture a lot of light and are very sensitive, the fact that I did not have one little reflector, or even a counter light mirror, was already a part of the challenge package. And of course lacking artificial light only helps when our dear Lord up there is really good to you and send you a lot of light. On the first day of shooting, we had this hell of a sunlight, so beautifully and ideally on Pedro´s (Ivo, who plays the protagonist) face. I could do whatever I wanted, set the camera on the most unusual angles, even though we had already established how and where they would be.
Did you storyboard the film?
"Umm... I think it´s coming out great"
No. Nothing was done. This thing I said about establishing things was because when we were scouting locations we already predetermined where we would put the camera for some of the shots – not all of them, some of them, the most important ones. And the only thing I had as a basis were some photos Emanuel sent me. They served as references for us because the camera angles were a little lower than usual – some sort of crazy idea, totally uncommon, that we tried to use with some characters, like the dog, for example. But unfortunately we couldn´t make it because the dog did not collaborate. We had this beautiful shot of the dog on the groud, and the camera was on the ground, too, making him look bigger than normal (the opposite that we did with Aparício, whom we shot from above, almost impounding him), but it only lasted for some seconds, because he soon went away. The rest of the shooting was all done on improv.
You´re obliged to be creative in these moments, right?
Of course. It´s ilummination both on set and off of it! (laughs)
You also worked with Jefferson Coppola in the film. He is a still photographer especialized on news reportage. This was his first movie, even though he has this famous surname! What was your collaboration like?
I initially called Jeff to shoot the stills for the film, which he did, and did it very well. But during shooting, he got involved in the process of lighting (again!), helping me out with lenses, because he had brought this beautiful lens for the first day, when we shot Pedro at Masp Museum, and soon afterwards his mother (played by Sonia Maria Silva). The angles that he chose for the stills were also very different from mine, because in general the still guy stays right next to the DP in order to get the same shots, but he deliberately did not do it – and this only enhanced his photos. Besides, he really knows how to explore spaces, lines on the ground, he took some awesome pictures of the shooting. We also talked a lot in between takes, exchanging ideas and suggestions, and I ended up giving credit for him as my co-DP.
Artificial eye
Besides being a cinematographer, you also work as a film colorist for movies, musical shows and videos. Which is more challenging for you – capturing images or working on them on post production?
They are similar in a way. Of course, on a shooting, you have all this paraphernalia that you don´t have on post, there´s this whole thing of running from here to there, it´s tumultuous, you try to set up the light here and there, work with a mirror there, you paint with light in a way that can be more crude, because you know you´ll have to make corrections on post. But today everything became more accessible, especially after the mourning and later death of film – and mainly because today you have all these softwares at your disposal, you have DaVinci, used with Black Magic, or Light Room, and you can use them in your computer, which enables you to work from home.
It seems that on It´s Almost True you guys worked on post to get the images closer to film.
Oh, yeah, that happened. Because Emanuel wanted to take out this video-look of the whole thing. Some scenes, mainly the ones which involve camera movement, like panning and tilting, did not flicker the way you see on film – it was all too evident it was shot on video. We shot the whole film with the 5D, which, at the time of the shooting, July 2011, was a fashionable camera, and it is a very good camera, with a nice sensor which gives you a texture closer to what would be a 16mm film stock, only a little better. What stuck on our way was that Emanuel showed me this beautiful restoration done on Casablanca, with a lot of film grain, a gritty look – but also very dark and very rich. We resolved then to make our “restoration” following the guys at Warner Bros. without necessarily leaving too much noise.
To conclude: what is more challenging, working with color or black and white?
Both give you pleasure to work with and each brings their own challenges. You can do a zillion gazillion things experimenting with color – you can saturate it, make it hotter, more evident on the image, and then you can get an interesting effect. You can take it out a little, say 60%, which was what the guys did for Saving Private Ryan and then get another atmosphere. Possibilities are endless. Black and white is… well, black and white, right? Many imperfections that sometimes occur in color you can “hide” them by using black and white, but the effect in itself is already beautiful. Of course you can work on contrast, luminosity, intensity, which will give you another look. Everything is connected to aesthetics, with your intentions, what you want to communicate with your work.




Foi o talento com as palavras – oscilando entre trabalhos acadêmicos e seus dois livros como autor, Darwin – O Naturalista da Evolução das Espécies, Comte _Sociólogo e Positivista, quanto traduções de livros sobre filosofia para a coleção da Editora Escala, além do senso de humor afiadíssimo e uma admiração pelos quadrinhos de Angeli, Laerte e Adão – o que nos trouxe próximos de André Campos Mesquita. Nascido em Franca, no interior de São Paulo, André morou em Itumbiara, Uberlândia e mudou-se para a capital paulista na década de 1990. Formado em Letras pela Universidade de São Paulo, André também é mestre em Linguística pela mesma faculdade. Atuou como professor e coordenador de alunos na Escola de Negócios Trevisan, em cursos pré-vestibulares do Anglo em São Paulo, até ser fisgado roteirista dos filmes Amarar e É Quase Verdade. Nesta entrevista, ele conta como foi o processo de escrita do roteiro, suas influências cinematográficas e sua experiência por trás das câmeras na websérie Os Chorões.
Espera aí. “Contatos telepáticos com sapos de enfeite”? Explica melhor essa história.
Ela tem a ver com a escrita do roteiro. Mas na realidade começou bem lá atrás, alguns meses antes. Há muito tempo eu vinha pensando em um documentário sobre mendigos de rua – entrevistar mesmo esse pessoal que dorme nas calçadas, que está ali nas ruas por inúmeras razões. Acho essa situação toda muito triste. Ainda mais quando se vê o número de prédios abandonados no centro da cidade, onde não há ninguém morando. Propus essa ideia para o Emanuel (Mendes, diretor do filme), e ele me devolveu dizendo que achava mais interessante fazer um mockumentary, um documentário falso tirando um sarro da eterna situação do cinema brasileiro de mostrar somente a pobreza, a violência e o atraso do país em festivais mundo afora. A ideia dele era provocar, ironizar essa situação. No início não entendia como essas duas ideias poderiam estar juntas em um roteiro, mas decidimos trabalhar com essa perspectiva. Como sempre acontece com a gente, escrevemos uma primeira versão que era um lixo – abominavelmente chata, que não tinha nada a ver com nada. Esse mesmo problema aconteceu com o Amarar, o filme anterior que fizemos, mas lá não tínhamos consciência da ruindade da coisa (risos). Aqui, pelo contrário, sabíamos que tínhamos escrito um negócio muito ruim. Enfim, deixamos a coisa descansar, não pensamos muito a respeito, e só bem depois, sentados em um bar, literalmente rabiscando coisas em guardanapos e conversando sobre a história, o Emanuel decide ir ao banheiro e volta me dizendo que tinha um sapo de enfeite lá dentro muito engraçado. Quando tive de ir ao banheiro, resolvi checar o tal sapo. A primeira coisa que me veio à cabeça foi: por que cargas d’água alguém colocou um sapo de louça enorme em um banheiro de boteco? Fiquei olhando para o sapo e comecei a pensar no nosso roteiro. Tinha de ser algo inusitado como aquele sapo. Que fizesse as pessoas se perguntarem por que eles colocaram isso aqui? Esse era o problema do outro roteiro e provavelmente o problema de muitos filmes que falam da pobreza e da miséria. Eles estão calcados na obviedade enorme. As personagens são sempre movidas, sufocadas e aprisionadas pela miséria. A pobreza é quase uma paisagem para o espectador. O que não deixa de ser uma zona de conforto. O nosso personagem não poderia ser assim. Ele deveria emergir da miséria, e apontar o dedo na cara das pessoas. Ele deveria ter uma voz que fosse além da sua condição. Apontar o dedo para as pessoas, incomodar mesmo. Súbito, voltei do banheiro com uma série de ideias, que despejei para ele imediatamente. Anotamos tudo, rapidamente. Em seguida nos separamos; o Emanuel montou depois o esqueleto da história, toda a estrutura, e eu acrescentei os diálogos. Foi mais ou menos assim que aconteceu. 
Dupla Mendes & Mesquita escreve, escreve, escreve...
Vocês sempre trabalham assim? Um monta a estrutura e o outro escreve os diálogos?
Em geral, sim. Mas o Amarar não tinha diálogos, então montamos a estrutura toda juntos. A princípio pensamos em inserir cartelas, como as do cinema mudo, mas elas não funcionaram – como a da “sega”, com S.
Sega com S? Ei, isso está ficando muito interessante. Explica melhor essa daí também.
Haha. É que num dado momento do roteiro do Amarar pensamos em fazer como o cinema mudo, ou seja, colocar cartelas que ou comentavam a ação ou trariam diálogos. Numa dessas eu apareci com esse tal de “sega”, que vem do verbo segar, que é a mesma coisa que ceifar, cortar, fazer a colheita. Engraçado que já nem me lembro mais o porquê dessa cartela (risos), mas enfim... ela estava lá. Aí o Emanuel tirou um sarro dizendo que só eu e mais duas pessoas na plateia iriam saber o que é isso, e, pior, as pessoas iriam achar que nós éramos dois burros cinematográficos, porque não sabíamos escrever! (risos)
"Acho que sei como resolver esse problema do roteiro."
Como é o processo de colaboração de vocês dois? Brigam muito? Discutem?
Em geral nos damos muito bem – um joga uma ideia para o outro que devolve com outra ideia ou acrescenta alguma coisa à anterior. Mas é claro que temos nossos arranca-rabos de vez em quando – especialmente quando o Emanuel vem com aqueles nomes absurdos de personagens que só ele gosta, coisas como Austragésilo Tainha e congêneres. Mas em geral nos damos muito bem. Acho que a coisa toda é como um casamento. O melhor é que eu não preciso ter papas na língua para falar com ele. Se não gosto de algo falo logo. Isso deixa as coisas bem transparentes. É fácil porque somos amigos acima de tudo. Nada que eu disser do ponto de vista profissional vai deixá-lo zangado. Bom, assim espero (risos).
É Quase Verdade deve ter sofrido influências não apenas de documentários mesmo mas dos documentiras do cinema. Quais foram os filmes que vocês se basearam para imaginar a história? Ou não houve algo do tipo?
A primeira coisa que conversamos foi sobre o Zelig, do Woody Allen, que é um diretor que gosto muito. Acho o filme genial – essa história do cara que é uma espécie de camaleão querendo agradar a todo mundo. O que não deixa de ser sintomático da própria situação do cinema brasileiro, de fazer na maioria das vezes fitas “para gringo ver”, de querer mostrar situações e/ou histórias absolutamente condizentes com essa ideia de sermos uma espécie de colônia da Europa, que é mais ou menos o que o Guilherme de Almeida Prado diz num dos depoimentos do filme. Esteticamente não acho que foi muito além disso. E fora o Zelig não me lembro de termos tido outras referências. Tinha o Groucho Marx na maneira com que ele quebra a quarta parede e fala com a câmera. Eu também pensava muito no Chaplin, em especial no “vagabundo”. Era um mendigo com aquele espírito que queríamos. O modo como o Pedro (Ivo) – que faz o Aparício – aparece andando nas primeiras cenas mostra que ele capturou muito desse espírito. Não combinamos nada. Aquilo veio com o personagem. Ah, sim. Os Trapalhões. Nós tiramos o nome do personagem de um quadro dos Trapalhões. É curioso como a inspiração do filme tenha vindo quase toda de comédias.
Carlão Reichenbach iria interpretar o Príncipe Charles
Parece que, além do Guilherme de Almeida Prado, o Carlão Reichenbach também iria fazer uma participação.
Escrevemos os diálogos para os dois – os personagens deles teriam inclusive os nomes Príncipe William e Príncipe Charles, mas infelizmente o Carlão não pôde aceitar; estava com sérios problemas de saúde, fazendo exames, entrando e saindo de hospital e acabaria falecendo alguns meses mais tarde. Uma perda enorme. O Carlão estava sempre com algum trabalho e sempre algo de muita qualidade. É muito triste saber que não vamos nunca mais ver um filme novo de Carlos Reichenbach.
É curioso como o filme também tem essa pegada de cinema marginal – coisas como o que Andrea Tonacci, Rogério Sganzerla, Julio Bressane e Neville d´Almeida faziam na década de 1960.
E o próprio Carlão também. Sim, o personagem do Paulo Lustig é um exemplo disso. Toda a mise en scène da sequência parece que vem de lá. E olha que foi filmada em frente ao Cine Marabá, no centro de São Paulo, um dos templos da época áurea do cinema daquela época. Tudo muito improvisado.
Essa sequência, com o Paulo Lustig, foi escrita?  
Foi, mas de uma forma totalmente diferente. Se não me engano não havia nem indicações de cena, apenas frases. Era mais comportada. Foi o Paulo quem deu esse ar mirabolante e dionisíaco para a coisa. Infelizmente eu não pude acompanhar a filmagem – eles filmaram no mesmo dia do Guilherme, que nós rodamos no pátio do meu prédio. Depois o pessoal foi direto para o Marabá, e o Paulo estava lá, esperando a equipe.
Lustig como o produtor mendigando patrocínio: "Corta! Corta!"
Falando em influências cinematográficas, quais são as suas? Que diretores e/ou roteiristas você gosta ou não gosta?
Ah, eu tenho um flair para um monte deles. Gosto bastante do Woody Allen, como já disse. Tem também o Iñarritu, que é um diretor que aprecio muito. Certamente o Tarantino é um dos melhores hoje em dia. Meu gosto para cinema é muito amplo. Gosto de clássicos como Welles, Eisenstein, Hitchcock e essas obviedades, e gosto de trash como Joe Damato, Jess Franco etc. Adoro as pornochanchadas brasileiras, acho um gênero de cinema muito subestimado no Brasil. Com certeza o cinema marginal brasileiro também tem suas coisas muito interessantes. Sou fã confesso do cinema japonês, desde classicões como Kinoshita, Mikio Naruse, Kurosawa, Mizoguchi, Ozu, Imamura, até recentes como Hirokazu Koreeda e Yojiro Takita, que vem do meu fascínio por escritores japoneses como Kawabata, Mishima, Tanizaki e o Murakami, evidentemente.
A literatura também é um influência?
Para o cinema? Não sei. Talvez indireta.
O que você lê?
Nada espécífico. Leio muitos textos de linguística atualmente por causa do meu doutorado e não tenho tanto tempo para literatura. No geral, leio livros curtos intercalando com os textos técnicos e deixo os grandes para as férias quando tenho mais tempo. Estou começando um livro de um escritor angolano, Pepetela. Gosto muito de quadrinhos também. Eu e o Emanuel nos inspiramos muito no Laerte, o quadrinista. Ele (ou ela) faz coisas geniais. Acho que são algumas das melhores ideias de todos os tempos – não só como texto em si, mas no visual também. Às vezes ele tem uns quadrinhos onde não há texto algum, apenas imagens, e elas contam uma história de maneira sensacional. Ainda na área das palavras ou roteiros, é impossível não mencionar o Billy Wilder, que escreveu alguns dos melhores diálogos do cinema. E ele tinha uma tirada sensacional: dizia que um roteirista tem dez regras a seguir. Nove delas são: não entediar o espectador!
Além de escrever roteiros, você também é tradutor e escreve peças de teatro e livros, um dos quais foi a biografia de Charles Darwin. Qual é a grande diferença entre literatura e roteiro de cinema?
Não era para ser uma biografia. Eu queria contar a história da ideia “evolução” dos gregos até agora. Os editores fizeram com que parecesse um livro sobre o Darwin. Como meu outro livro, era para ser um livro sobre o positivismo na América Latina, e virou um livro sobre o Comte (risos). Já  roteiro... Eu gosto de ser simples, sem firulas, ir direto ao ponto. Até porque o seu leitor é o pessoal que vai trabalhar na produção, os atores etc. Ele é uma das etapas até o trabalho final, que é o filme em si. Na literatura você tem mais recursos, eu acho. O leitor tem mais tempo para tentar entender o que você escreve do que o diretor do filme. Além do mais, você não pode escrever coisas abstratas em um roteiro do tipo: “Carlinhos senta na pedra e pensa na mãe”. Essa cena do pensar na mãe precisa estar escrita – como e onde acontece, de que jeito vai começar, quais os efeitos concretos que eventualmente ela vai ter. Não é fácil escrever roteiros simplesmente porque a natureza dele às vezes implica em você abandonar o estilo que teria na literatura, ele poda muito a imaginação, é mais objetivo e prático porque você está lidando com imagens.
Você estreou como diretor com a websérie Os Chorões em 2012. Como foi a experiência do passar para trás das câmeras?
Foi legal. Os atores e o pessoal técnico me ajudaram muito. O Chico (Francisco Costabile) e o Emanuel vieram com essa ideia de uma série para a internet como pontapé inicial para que a produtora deles entrasse na área da web, e aí nós bolamos os roteiros dessas historietas inspiradas por manias, crítica social e política. O episódio que dirigi foi um evento que aconteceu comigo em sala de aula, quando pedi a um aluno para que lesse o Dom Casmurro, do Machado de Assis, e ele me perguntou por que tinha que ler um livro inteiro falando sobre um machado! (risos) Demorou para me cair a ficha, mas eu simplesmente achei aquilo surreal, não podia ser verdade.
Talvez aí esteja também uma das inspirações para É Quase Verdade.
É bem provável que sim!


 

It was his talent for writing – exercised in such works as theater plays for the Célia Helena Company in São Paulo, his first book as an author, Darwin – O Naturalista da Evolução das Espécies, as well as his translations of philosophy books for the Escala Publishers, and a sharp sense of humor and his admiration for the cartoonist Laerte – the elements that brought André Campos Mesquita to us. Born in Franca, in the São Paulo countryside, André lived in Campinas, Uberlândia and moved to São Paulo in the early 1990s.  Graduated in Linguistics from the São Paulo University, André is also a master in the field from the same place. He has worked as a professor and student coordinator at Trevisan Business School, pre-university courses, and a translator in medical literature for Merck, until he was hooked as a writer for the films Amarar and It´s Almost True. In this interview, he tells about the scriptwriting process, his cinematographic influences and his experience behind the camera in the webseries The Criers.
Wait a minute. “Close encounters with an ornament frog”? Tell us more about this.
It has to do with the writing of the screenplay. But it actually started long ago, some months prior to that. I had been thinking for years about making a real documentary about beggars and homeless people in São Paulo – those people who sleep in the sidewalks, who most of the times do not wish or do not have conditions to have a home. I think this is really an abominable situation, something very sad. Especially when you see a lot of empty buildings around in the city of São Paulo. I proposed this idea to Emanuel (Mendes, the director of It´s Almost True), who hit it back at me saying that he thought to be more interesting to make a mockumentary about the eternal situation of Brazilian Cinema showing only the poverty, the slums and the violence in the country in festivals worldwide. The idea was to provoke, to be ironic about this situation. I thought it was interesting and we decided to work on that. But as it´s usually the case with us we wrote a first draft that was almost impossible to read – a real crap of a script that had nothing to do with anything. This very same problem happened to us when we wrote Amarar, the previous film of ours, but there we were not conscious how bad it was (laughs). Here, on the other hand, we knew we had written something real bad. So, we decided to just forget it for awhile, not really think about it, and only later, much later, sitting at a bar table, writing on napkins and talking about the story, Emanuel decides to go to the bathroom and comes back telling me about an ornament frog inside that he thought very funny. I decided to give it a check (but I needed to take a pee anyway), and misteriously, after solving my problem, I kept staring at the frog, kind of hypnotized by it – and it, BTW, was made of clay, really awkward and weird. Suddenly I came back from the bathroom with a series of ideas, that I threw at him instantaneously. We took notes on everything very quickly. Then each went his way; Emanuel soon afterwards wrote the whole body of the script and I added up the dialogues. It was more or less like this.
Duo Mendes & Mesquita write, write, write...
Do you always work like this? One writes the body and the other writes the dialogues?
Well, yeah, in general. But Amarar did not have dialogues whatsoever, so we built the whole structure ourselves. At first, with this film, we thought about inserting intertitles, but they did not work – like the one we did with the verb to harvest*
*Here André makes wordplay because the verb he uses in Portuguese is segar, which means to harvest, but it´s the same sound of the verb cegar, which means to blind.
To harvest? What do you mean by that?
Haha. Well, in a particular time when we were writing Amarar we thought about making it like silent pictures, that is, inserting intertitles that would either comment the action or bring up dialogues. In one of those moments, I came up with a sega (the harvest), which means to harvest, to crop. Funny because I don´t remember anymore why I wanted that intertitle (laughs), but anyway, it was there… Then Emanuel told me that only two or three people in the audience would know what that is, and also people would think that we were two cinema dumbs because we couldn´t write! (laughs)
"I think I know how to solve this script problem."
What´s the colaboration process of you two like? Do you fight a lot? Do you argue a lot?
In general we get along pretty well – one throws an idea to the other who either hits it back or adds up something to that idea. But of course we have our arguments once in a while – especially when Emanuel turns up with those stupid names he creates, and that only he cares about, things like Austragésilo Tainha and stuff like that. But in general we hit along pretty well. I think the whole thing is like a marriage, you know.
It´s Almost True must have had a lot of influences not only from real documentaries but from mockumentaries as well. What were the films you two based upon to create the story? Or there wasn´t something like that?
The first thing we talked about was Zelig, the Woody Allen film, who is a director that I like very much. I think the film is pure genius – the story of this guy who is a sort of chameleon wanting to please everyone, which is also symptomatic of the situation of Brazilian Cinema, that at most times makes films for the gringos, wanting to tell stories that are completely in synch with this idea of us being a European colony, which is more or less what (film director) Guilherme de Almeida Prado says in one of It´s Almost True´s interviews. Aesthetically I don´t think it went further than that. And aside from Zelig I don´t recall any other film references.
Director Carlos Reichenbach would play Prince Charles
It seems that, besides Guilherme de Almeida Prado, Carlos Reichenbach would also be in the film.
We wrote dialogues for both of them – their characters, BTW, would have the names of Prince William and Prince Charles, but unfortunately Carlos could not accept; he had serious health problems, in and out of hospitals, and would die a few months later. Such an enormous loss. Reichenbach always had some film around and it was always something of real quality. It´s very sad to know that we will never see a new film by Carlos Reichenbach again.
It´s also very curious to see that It´s Almost True has a foot on the so called underground cinema of the 1970s – things made by directors like Andrea Tonacci, Rogério Sganzerla, Julio Bressane and Neville d´Almeida.
And Carlos Reichenbach, too. Yeah, the character played by Paulo Lustig in the film is an example. All the mise en scène of the sequence seems to come from that kind of cinema. And the scene was shot in front of Marabá Cinema, in São Paulo downtown, one of the mecas of the golden age of the period. Everything was a lot done on improv.
Was this sequence with Paulo Lustig written?
It was, but in a totally different mood. If I´m not mistaken there was no action, only his lines. The scene was a lot more well-behaved. It was really Paulo the one who gave this crazy, almost lunatic punch to it. Unfortunately I couldn´t go to the shooting – they shot it on the same day as Guilherme´s, who we filmed in my building´s area. Then the crew went straight to Marabá, where Paulo had been waiting for them.
Speaking about cinematographic influences, what are yours? Which directors and/or writers do you like or don´t like?
Lustig as the Brazilian producer begging for sponsorship: "Cut! Cut!"
Oh, I have a flair for a lot of them. I like Woody Allen a lot, as I said. There´s also Iñarritu, who is a director I quite like. Certainly Tarantino is one of the best today. My taste for the Cinema is very wide. I like classics such as Welles, Eisenstein, Hitchcock, the obvious ones, and I like trash ones like Joe Damato, Jesse Franco etc. I love the Brazilian Pornochanchada, I think it is a very underestimated genre. Certainly the so called Brazilian Underground Cinema has its interesting things. I´m a huge fan of Japonese cinema, from classics like Kinoshita, Mikio Naruse, Kurosawa, Mizogushi, Ozu, Imamura, until recent directors like Hirozaku Koreda and Yojiro Takita, something that comes with my fascination for Japanese writers like Kawabata, Michima, Tanizaki, and Murakami obviously.   

Is Literature an influence as well?

For the cinema? I don´t know. Maybe.

What do you like to read?

Nothing specific. I´ve been reading a lot of Linguists because of my Doctorate and so I haven´t really had the time for Literature. In general, I like to read short stories interlaying with technical texts and I leave the bigger books for my vacations when I have more time. I´ve started a book from an Angolan writer called Pepetella. I like comic books a lot as well. Me and Emanuel got inspired by Laerte. He (or she, I don´t know) produces things that are pure genius. I think some of them are among the best ideas ever written - not only as a text per se, but also in the visuals. Sometimes he has some comic strips with no dialogue at all, only visuals, and they tell a story wonderfully. Still in the field of scripts, it´s impossible not to mention Billy Wilder, who wrote some of the best dialogues in the history of cinema - he had, BTW, a great phrase which said: "A writer must follow ten rules. Nine of them is not bore your audience!" 
Besides writing screenplays you are also a translator and write theater plays and books, one of them being a Charles Darwin biography. What is the difference between literature and movie script?
It wasn´t to be a biography. I wanted to tell a story of the "idea" of evolution, from the Greeks up until now. The publishers gave this thing that it was a book about Darwin. Like my previous book, which it was to be about Positivism in Latin America, but it turned out a book about Comte (laughs). As for scriptwriting... Oh, a screenplay needs to be extremely simple, fair and square, go straight to the point, which is something that does not happen in literature, that has a cadence of its own, a breathing more attuned to the imagination. Besides, you can not write abstract things on a script such as Carlinhos sits on the rock and thinks about his mother. This scene of him thinking about the mother has to be written down – how and where it takes place, the way it will start, which concrete effects it will have and so on. It´s no piece of cake writing a script simply because its nature calls for you kind of abandoning the style you would have in literature, a script can sometimes trim your imagination, it is more practical because you´re dealing with moving images.
You debuted as a director in the webseries The Criers in 2012. What was the experience like to be behind the cameras?
It was cool. The actors and the technical department helped me a lot. Chico (Francisco Costabile) and Emanuel came up with this idea of a webseries as a kickstart for their company to enter in the internet department, and then we created these screenplays of short stories inspired by manias, social and political criticism. The episode that I directed was inspired by an event that actually happened to me in classroom, when I asked a student to read the book Don Casmurro, by Machado de Assis (famous Brazilian writer of the 1800s and early 1900s), and he asked me why he had to read an entire book about an axe!* It took me a long time to drop the coin, but when it did, I found it absolutely surreal, couldn´t be true.
*Again André makes wordplay because the student mistakes the author´s name, Machado (which means axe), for the title of the book, which is Don Casmurro.
Maybe this is one of the inspirations for It´s Almost True.
It may very well be true!






Bem-vindos à nossa primeira das séries de entrevistas com alguns dos principais membros da equipe de É Quase Verdade. Começamos com a produtora Bianka Saccoman, que, embora atue em outras áreas dentro e fora da Sincronia Filmes, teve sua primeira experiência na área produzindo o média-metragem que é também a primeira produção-solo da companhia. Nascida em São Paulo, Bianka desenvolveu cedo o gosto pelas artes, familiarizando-se primeiramente com as palavras. Jornalista formada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, em Campinas, é especializada em produção cultural, e, além de cinema, já atuou nas áreas de teatro, música, dança e outras manifestações culturais – chegando até a cobrir eventos do porte de um Lolapalooza, em sua edição chilena, por exemplo, razão pela qual aumentou consideravelmente seu interesse pela área musical. Aqui, com muito bom-humor, ela fala sobre É Quase Verdade e como foi levar a cabo uma produção feita tipicamente sem dinheiro. Ou melhor dizendo, quase sem dinheiro. Esperamos que gostem.

Como você se envolveu na produção de É Quase Verdade?

Eu já vinha trabalhando com os meninos dentro da produtora fazia um tempinho – eles me conheceram quando todo mundo se reuniu para fazer o curta-metragem O Homem Que..., que foi a primeira produção da Sincronia Filmes. Dali, eles me chamaram para não só atuar como produtora e produtora executiva, porque o É Quase Verdade iria ser a primeira experiência-solo da produtora, mas também para dar uma mão no processo de estruturação da empresa.

Você participou como assistente no O Homem Que... e depois saltou para a produção e produção executiva em É Quase Verdade. Na sua opinião, existe uma diferença muito grande entre as duas funções?

Bem, diferenças existem, é claro, simplesmente porque as responsabilidades são maiores. Quando você é assistente, o que você faz basicamente é seguir o que o produtor te pede – e no caso do O Homem Que..., fiz a correria de se conseguir o estúdio no qual gravamos as cenas do Mario Morhle e o Pedro Ivo, ajudei a resolver uns pepinos que apareciam durante a filmagem, entre outras coisas que não são, digamos, de tanta responsabilidade assim. Já no É Quase..., o que fiz foi o trabalho de execução mesmo, ou seja, ajudar a levantar a produção, correr atrás do elenco, de fechar as locações, equipamento, essas coisas. As funções são semelhantes, mas o que as diferencia são os deveres.
Roteiro em mãos, com o diretor Emanuel Mendes.

Você também se envolveu na pós-produção?

Não tanto – mas não porque eu não quisesse, mas porque era importante deixar o Emanuel (Mendes, diretor do filme) e o Francisco (Costabile, que fez a montagem) mais livres para poderem trabalhar. É claro que você acompanha o processo, nem que seja de longe, e a gente sempre se encontrava porque paralelamente estávamos desenvolvendo outras coisas.

E como é produzir um filme sem orçamento – ou com orçamento muito reduzido?

Pois é, veja só você a situação – uma das coisas que o filme ironiza é justamente isso, essa dificuldade de se obter financiamento para se fazer cinema no Brasil, seja ele curta, média ou longa-metragem. E aqui estávamos nós realizando um filme quase sem orçamento nenhum (risos). É claro, você tem dinheiro para o básico, como comida, mobilidade, um equipamento que você tem que alugar aqui ou ali, essas coisas você não têm como escapar, mesmo para o curta-metragem, ou o média, como era o nosso caso. Mas o mais legal de se trabalhar nesse tipo de formato é que, justamente pela escassez de apoio a ele, as equipes são obrigadas a se unir, todo mundo trabalha em prol do filme, porque acredita no roteiro, compra a ideia – tudo isso é muito bacana. Foi como fizemos o É Quase Verdade.

Mas isso também deve trazer muitos problemas e dores de cabeça, não?

Não necessariamente – ou pelo menos não tão diferente do que você enfrentaria caso tivesse dinheiro. Por exemplo, no começo do projeto, quando pensávamos em colocar o roteiro em um edital, e assim ter mais grana, havia uma versão do script onde o personagem do Pedro Ivo, o Aparício, viajava para Nova York – nós chegamos a orçar as passagens aéreas para que só o Emanuel, o Pedro e o Mario (Cassettari, diretor de fotografia) pudessem ir, filmar lá um fim de semana, e voltar com o material – mas evidentemente a coisa era inviável, porque os custos não seriam apenas com as passagens. Agora, quanto a não ter dinheiro, ou ter muito pouco dinheiro, as dificuldades são as mesmas, o que talvez aconteça, e é a causa de estresse ou nervosismo, é o fato de as vezes as pessoas não estarem disponíveis quando se precisa delas, você tem que esperar o tempo delas acontecer para poder viabilizar as coisas, mas ainda bem que nós tivemos uma equipe maravilhosa – todo mundo realmente comprometido com o filme e sua realização, e que, na medida do possível, foi de extrema lealdade ao projeto. É isso o que dá prazer em uma profissão como essa.

Dando uma força no making of do filme.
Essa lealdade também se estende às funções, não é mesmo? Porque normalmente, em um curta ou média-metragem, pelo fato de as equipes serem muito reduzidas, todo mundo acaba fazendo um pouco de tudo, não é?

Nós tínhamos uma equipe minúscula! Além de ter feito a produção, tanto a da pré quanto a correria dentro do set, eu também cuidei da câmera do making of, rapaz! (risos), e cheguei a fazer maquiagem nos atores quando o Ney (Guimarães, diretor de arte) não pôde ir em um dos dias da filmagem. E o pessoal se dividiu mesmo – apesar de todo mundo saber suas funções dentro do projeto.

Vocês chegaram a filmar durante a semana ou apenas nos finais de semana, como normalmente acontece?

Ambas as coisas. O primeiro dia, debaixo do vão do Masp, foi filmado em uma quinta-feira de julho de 2011. Mas nesse dia, graças a Deus, não tivemos que pegar trânsito, porque a cidade estava um inferno – como se já não fosse todos os dias. Conseguimos resolver tudo o que precisávamos naquele dia mesmo, com todos os atores. O único dia que precisamos do carro foi quando tivemos que filmar o trajeto para o aeroporto internacional de Guarulhos e as tomadas lá dentro – e nossa sorte foi que fizemos tudo isso num domingo. A logística foi toda preparada! Nós nos divertimos à beça filmando na estrada, foi literalmente uma viagem para o aeroporto, com paradas para troca de lente na câmera, gente querendo ir ao banheiro e tudo o mais (risos). E, de novo, o pessoal foi muito leal ao projeto.          

Até mesmo o cachorro foi leal? Pelo que sei, parece que ele deu algumas dores de cabeça.

Sim, um pouquinho (risos). Mas até ele chegou num ponto em que colaborou.
A produtora durante a filmagem de "É Quase Verdade".

Como é mesmo o nome dele?

João. Simplesmente assim. João. É um cachorro que hoje já está muito velhinho, mas está acostumado a ficar na rua e as pessoas o alimentarem. Quando chegamos lá, foi um sufoco para conseguir deixá-lo quieto, por dois motivos: primeiro porque acho que ele ficou um pouco excitado com tanta gente em volta dele, querendo que ele desse um depoimento (risos). E segundo porque havia uma garota, bem mais nova do que ele, que estava no pedaço, e é lógico que ele estava muito mais interessado nela do que aparecer em um filme! (risos)

Eu também ouvi dizer que inicialmente quem iria fazer a voz do cachorro era o Juca de Oliveira.

Ah, sim, tivemos essa história também. Nós chegamos a enviar o roteiro para ele via o André (Campos Mesquita, corroteirista do filme), que, na época da pós, estava fazendo um freela para uma rádio aqui em São Paulo onde o Juca tinha um programa. Ele chegou a ler o roteiro, gostou, mas infelizmente não pôde fazer por problemas de agenda. De qualquer forma, acho que a ideia inicial sempre tinha sido a de ter aquela voz metálica – semelhantes àquelas que as reportagens fazem quando entrevistam drogados, menores de idade ou pessoas que não querem ou não podem aparecer – e o blur em cima do rosto do João. O efeito sempre foi procurar o cômico, o inusitado, porque a fala do cachorro é muito engraçada, mas trágica ao mesmo tempo.

Você também tem escolaridade no documentário e é jornalista de formação – escreveu um livro sobre Eduardo Coutinho e chegou mesmo a entrevistá-lo. A produção audiovisual brasileira é muito rica e diversificada neste gênero. Na sua opinião, qual a grande coisa que o documentário traz?

Bom, não tive o prazer de entrevistá-lo. Apenas o conheci durante a exibição do seu filme Cabra Marcado para Morrer na Cinemateca e troquei algumas palavras. Pra mim, o documentário e, principalmente, o documentário do Coutinho, está fortemente ligado à minha profissão, e me ensinou muitas coisas sobre ela. Em especial na maneira de entrevistar e na troca de experiências que existe em uma conversa. Nos dois casos, jornalismo e documentário, a palavra é o fio condutor. Nesse sentido, acredito que a  beleza do documentário esteja justamente em dar voz aos muitos personagens da vida. 





Welcome to our very first series of interviews with some of the crew members of It´s Almost True. We will be talking in depth to many of them and today we have a special conversation with Bianka Saccoman, who, even though acts in other areas in and out of Sincronia Filmes, had her very first experience of producing a film with this short which is, also, the first solo production made by the company. Born in São Paulo, Bianka developed at an early age her taste for the arts in general, getting in touch with the written words first place. A Journalist graduated from Mackenzie University, in Campinas, she is an expert in cultural production, and, besides the cinema, has been working for the theater, the musical arena, dancing and other cultural manifestations – she even covered events such as the Lolapalooza Music Festival, in Chile, one of the reasons she has gradually invested her interests in the musical universe as a whole. Here, with a good sense of humor, she talks about the shooting of It´s Almost True and what it was like for her to tipically make a film with no money. Or, better, with almost no money. We hope you like it.

How did you get involved in the production of It´s Almost True?

I had been working with the boys inside the company for awhile – they met me during the shooting of the short The Man Who…, which was the first production by Sincronia Filmes. From then on, they asked me to act not only as a producer or executive producer, because It´s Almost True would be the first solo experience for the company, but also to give them a hand in the process of structuring the company itself.

You were an assistant in The Man Who… and then jumped right in the production´s chair for It´s 
Almost True. In your opinion, is there too much of a difference between these two areas?

Well, the differences exist, for sure, simply because the responsabilities are bigger. When you are an assistant what you basically do is follow the producers´s instructions – and in the case of The Man Who…, I ran around to get the studio that we shot the scenes with actors Mario Morhle and Pedro Ivo, helped out to solve some tidbits that arouse during shooting, among some other things that are not exactly so that “serious”. But in It´s Almost True I really did the job of a producer, that is, take the production off the ground, run after the cast and crew, help scout the locations, get the equipment, those things. The functions are similar, but their duties make the differences.
Script in hand, with director Emanuel Mendes.
  

Did you also get involved in the post production?

Not that much – but not because I didn´t want to, but because it was important to let Emanuel (Mendes, the director) and Francisco (Costabile, the editor) more free so they could work. Of course, you follow the process, even if it´s by far, and we always would get together because at the time we were developing some other things.

And what it is like to produce a film with no budget – or with a very limited budget?

Yeah, you see the situation – one of the things the film is ironic about is exactly this, this difficulty to get financing to make cinema in Brazil, no matter if it´s a short or a feature film. And here we were making a film with no budget at all (laughs). Of course, you have money for the basics, like food, transportation, an equipment that you gotta rent here and there, those things that you can´t escape from, even for the short film, which was our case. But the great thing about working with this format is that, because of the lack of support, the crews are obliged to get together, to unite, with everybody working for the benefit of the film, because they believe in the script, they buy the idea – all that is very cool. That´s how we made It´s Almost True.  

But this must also bring a lot of problems and headaches, right?

Not necessarily – or at least not so different than if you were making it with money. For example, in the beginning of the project, when we thought about enlisting the script in one of those government cultural contests, and therefore have more money, there was a version of the screenplay where the character played by Pedro Ivo, Aparício, would travel to New York – we budgeted the tickets so that only Emanuel, Pedro and Mario (Cassettari, the DP) could go, shoot there during a weekend, and come back with the rushes – but of course the whole thing was not viable simply because the costs would not only be for the flying tickets. Now, as for not having money at all, or having so little money, the difficulties are the same, but what sometimes happens, and which causes stress and nervousness, is the fact that sometimes people are not at your disposal when you need them, you gotta wait for their right time frame in order to make things go, but we were really lucky to have such a wonderful crew – everybody really compromised with the film and its making, and, whenever possible, they were extremely loyal to the project. That´s what gives you pleasure about having a job like this.   

Giving a hand for the making of documentary.
This loyalty also goes for the functions, doesn´t it? Usually, in a short film, because crews are so small and reduced, everybody ends up making a little bit of everything, right?

We had a minuscule crew! Besides having produced it, both pre and set production, I also operated the making of camera myself, boy! (laughs), and I even did some of the make up on the actors when Ney (Guimarães, art director) could not go in one of the days. And our people really split the jobs – even though everybody knew their role in the project.

Did you shoot during the week or only on weekends as is usually the case?

Both things. The first day, under the Masp Museum, was entirely shot on a Thursday, in July 2011. But on this day, thanks God, we did not have to get traffic because the city was like hell – as if it is not like this everyday. We could solve all we had to do on that day, with all the actors. The only day we had to get the car was when we shot the trip to the International Airport and the scenes inside – and we were lucky because we did all that on a Sunday. The logistics was all prepared! We had a lot of fun on the road, it was literally a trip to the airport, with stops to change the camera lenses, people wanting to go to the bathroom and stuff like that (laughs). And again our guys were extremely loyal.

Even the dog was loyal? I understand he gave you guys a lot of headaches.

Yeah, a little bit. (laughs) But it got to a point when he collaborated.
The producer during the shooting of "It´s Almost True".

What´s his name anyway?

João. Simply like that. João. It´s a dog that today is really old, poor thing, but he is used to being in the streets and people feed him anyway. When we got there, it was really a hell to make him quiet and still, for two reasons: firstly I think he got a little excited to have so many people around him, in search for some words (laughs). And secondly because there was this girl, younger than he was, that was also around, and of course he was much more interested in her than making a movie with us! (laughs)

I also hear that the actor Juca de Oliveira would dub his voice.

Oh, yeah, we had this thing going on. We sent him the script via André (Campos Mesquita, the cowriter), who, at the time of post production, was on a freelance job at a radio station here in São Paulo and where Juca had a daily program. He read the script, liked it, but couldn´t do it because of schedule issues. Anyways, I think the initial idea had always been that of the methalic voice – similar to those ones when you interview drug addicts, children or people who can´t or do not wish to appear – and the blur over João´s face. The effect had always been the one side of comical, the unusual, because the dog´s lines are very funny, but at the same time are very tragic and sad.

You have experience on documentaries and are a graduated Journalist – you even wrote a book about Eduardo Coutinho and got to interview him. The Brazilian audiovisual production in this aspect has a flair on this genre. In your opinion, what is the thing with documentaries that appeals you the most?

Well, I didn´t have the pleasure to interview him. I just met him during a screening of his film 20 Years Later at the Brazilian Cinematheque and we exchanged a few words. To me, the documentary genre, and especially the documentary made by Coutinho, is strongly connected to my profession and has taught me a lot of things about it. In particular the way you get to interview people and the exchanging of experiences in a chatting. In both cases, journalism and documentary, the word is your main thing. So I believe that the beauty of the documentary genre is in exactly giving voice to the many characters of life. 




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